quarta-feira, 25 de setembro de 2019


D i s c i p l i n a   E c l e s i á s t i c a
Um ministério da Reconciliação
Horst R. Kuchenbecker
Introdução
     Disciplina eclesiástica é um assunto difícil de ser tratado e requer cuidado, humildade e oração. O assunto pertence à área da Teologia Pastoral. Pastores e leigos devem estar bem informados a respeito com base na Escritura Sagrada.
     Quem já teve de enfrentar casos de disciplina sabe como é difícil, quantas reuniões, que cuidado temos que ter nas palavras, quanto amor e paciência para com uma alma faltosa.
     Mesmo assim é preciso lembrar que a Disciplina Eclesiástica é um processo positivo, uma ação de amor para com nosso irmão na fé em falta. É a aplicação correta de Lei e Evangelho (Mt 19.16-24; At 16.25-34); é colocar a fé em prática em relação aos irmãos. (Ef  2.10; Gl 5.24-26; Rm 8.1-17) Isto requer de nossa parte, pastores e leigos, o estudo constante do livro: Lei e Evangelho, de  C.F.W. Walther.
     Que diz o Regimento de nossa congregação a respeito?[1] Que diz a Bíblia? Será que em nossos dias da tolerância, do não descriminar, do paz e amor, ainda é possível excluir alguém da Congregação se necessário? Como funcionam as Assembléias em nossas congregações? Há realmente a prática do aconselhamento, da repreensão, exercida pelo pastor e por leigos. Há compreensão para o exercício da disciplina eclesiástica, quer seja a disciplina  menor, com a abstenção da santa ceia, quer seja a aplicação da disciplina propriamente dita com exclusão do membros impenitente?
     Quais são as práticas em uso? Dr. Harrison, atual presidente da LCMS, relata: - Saí do culto e me dirigi para casa. Na calçada um vizinho me abordou e perguntou: - Você é o pastor dessa igreja? – Sim, respondi. – Jamais vou me filiar aqui. Você sabe por quê? Seus membros são um bando de hipócritas! – Sei, sim! Respondeu o pastor. E sempre há lugar para mais um! – A pessoa ficou incomodada, o pastor lhe disse: - Deixa-me explicar. Realmente a Igreja é composta de pecadores que vem aqui em busca do perdão. E neste sentido, sempre há lugar para mais um. Passe bem! E foi para casa.
     Um pastor estava incomodado com seus membros e resolveu fechar a Comunidade. Ele anunciou o seguinte: “Encerro a Comunidade. Quem quiser realmente ser membro e seguir a Cristo, deverá solicitar nova inscrição, para sua filiação.” Surpreendentemente, o pastor sobreviveu. Um colega dele gostou da idéia e quis imitá-lo. Resultado: A Comunidade  demitido o pastor.
    No ano de 1973, perguntei ao presidente de nossa igreja irmã, a Lutheran Church Missouri Synod  (LCMS): Quanto tempo leva a disciplina eclesiástica a um pastor? Resposta: No mínimo cinco anos.
     Vejam a complexidade desse assunto.

Preliminares

     A Disciplina Eclesiástica não pertence à essência da Igreja. Em Comunidades novas que ainda carecem de uma melhor fundamentação na  doutrina, ela não deve ser praticada, se bem que Lei e Evangelho devem ser pregados e o pastor e os leigos devem admoestar as pessoas faltosas.
     A finalidade da Disciplina Eclesiástica não é purificar a Congregação, mas em amor fraternal admoestar pecadores para que sejam levados ao arrependimento e firmados na fé.
     A Disciplina Eclesiástica no seu sentido final só poderá ser aplicada, quando, conforme Mateus 18, os dois passos anteriores terem sido aplicados com paciente e persistente amor, mas sem sucesso. O objetivo é ganhar o irmão faltoso.
     Após a apresentação deste tema, um colega pastor me disse: Pastor! Eu vim para esta conferência com o intuito de aprender novos métodos para purificar minha congregação e saio daqui com bem outra visão sobre o tema: O objetivo da Disciplina Eclesiástica não é purificar a Comunidade, mas ganhar uma alma que se está desviando. Muito obrigado.
I - Exegese de Mt 18.15 -18

1.1 – O textos – Vejamos em primeiro lugar as diferentes traduções deste texto.
- Se teu irmão pecar (contra ti), vai argüi-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que pelo depoimento de tuas ou três testemunhas, toda a palavra se estabeleça. E, se ele não os atender, dize-o à igreja, considera-o como gentio e publicano. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus. (Mateus 18.15-18 RA)

- Se o seu irmão pecar contra você, vá e mostre-lhe o seu erro. Mas faça isso em particular, só entre vocês dois. Se essa pessoa ouvir o seu conselho, então você ganhou de volta o seu irmão. Mas, se não ouvir, leve com você uma ou duas pessoas, para fazer o que mandam as Escrituras Sagradas. Elas dizem: “Qualquer acusação precisa ser confirmada pela palavra de pelo menos duas testemunhas.” Mas, se a pessoa que pecou não ouvir essas pessoas, então conte tudo à igreja. E, se ela não ouvir a Igreja, trate-a como um pagão ou como um cobrador de impostos. Eu afirmo a você que isto é verdade; o que vocês proibirem na terra será proibido no céu, e o que permitirem na terra será permitido no céu. (Mt 18.15-18 NTLH)

- Sündiget aber dein Bruder an dir, so gehe hin und strafe ihn zwischen dir und ihm allein. Höret er dich, so hast du deinen Bruder gewonnen. Höret er dich nicht, so nimm noch einen oder zween zu dir, und auf dass alle Sache bestehe auf zweier oder dreier Zeugen Mund. Höret er die nicht  so sage es der Gemeinde. Höret er die Gemeinde nich, so halt ihn als einen Heiden und Zöllner. Wahrlich, ich sage euch: Was ihr auf Erden binden werdet, soll auch im Himmel gebunden sein, und was ihr auf Erden lösen werdet, soll auch im Himmel los sein. (Mt 18.15-18, Lutero)

- If your brother sins against you, go and point out his sin to him when you`re alone with him. If he listens to you, you have won your brother. But if he won`t listen, take one or two with you so that you have two or three witnesses to establish every word. If  he won`t listen to them, tell it to the church. But if he won`t even listen to the church, treat him like an pagan and a tax collector. I tell you the truth, whatever you bind on earth will be  bound in heaven, and whatever you set free on earth will be free in heaven. (Mt 18.15-18 An American Translation, Beck)

- Se pecar (contra ti) o irmão teu, vai corrige a ele entre ti e ele somente. Se a ti ouvir, ganhaste o irmão teu; se mas não ouvir, toma contigo ainda um ou dois, para que por boca de duas testemunhas ou de três seja estabelecido tudo assunto; Se e recusar-se a ouvir a eles, dize à igreja; se e também à igreja recuar-se a ouvir seja(ele) para ti como o gentio e o cobrador de impostos. Amém. digo a vós; tudo  que ligardes sobre a terra (por certo) estará ligado em  (o) céu, e tudo que desligardes sobre a terra estará desligado em (o) céu. (Interlinear)
Obs.: O verbo “ligar” (deeseete  part. Perf. Passivo de (déoo)

1.2 – O significado
- O que significam essas palavras? Será que eu posso forçar Deus a perdoar no céu o pecado que eu perdoo a uma pessoa aqui na terra; ou para Deus não perdoar a um pecador ao qual eu não perdoo os pecados aqui na terra?  Será esse o sentido?

-  Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus (Mateus 16.19 RA). A Concordia Self-Study Bible comenta: Pedro usou esta chave no dia de Pentecostes (At 2), quando anunciou que a porta do Reino de Deus está aberta a judeus, prosélitos e gentios. “Arrependei-vos... Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos, e para todos os que ainda estão longe... (At 2.38-39) O que aprendemos disso? Que a Igreja cristã não julga como autoridade, mas ela anuncia a lei, que mostra à pessoa sua culpa; e ela proclama o evangelho ao pecador e certifica o pecador arrependido de que Deus lhe perdoou os pecados, Cf.: At 5.3,9. Isto dá outra visão à Disciplina Eclesiástica. Portanto, a Igreja cristã não condena, mas anuncia o julgamento divino e o faz com amor, não para o mal de alguém, mas para salvá-lo. Numa palavra mais rude: A igreja não vem para matar, mas para salvar.[2]
     Jesus mostra a uma pessoa e para a Comunidade como proceder com um irmão na fé que se desviou, quer por questão de doutrina ou de comportamento ético moral. O procedimento acontece em sincero amor fraternal, seguindo-se os passos indicados por Jesus. O ligar e desligar no céu que torna o procedimento um procedimento oracional.


II - Disciplina Eclesiástica

    Vamos ao tema. Mark Twain disse, certa vez, a respeito do tempo: Todos falam dele, mas ninguém entende nada a respeito do tempo. Talvez possamos dizer o mesmo a respeito da Disciplina Eclesiástica.
     Quando falamos da Disciplina Eclesiástica, tanto leigos como pastores, têm medo desse tema. Os leigos dizem: Isto é com os pastores e a Diretoria. Pastores e Diretorias dizem: Quem somos nós para julgar alguém, ou mais precisamente: Eu me sinto indigno para isso. A confrontação sempre é algo terrível e confuso, até revoltante.
     Na realidade, o pastor deve exercer a disciplina eclesiástica,[3] mas não sem mais nem menos. Há precedentes a serem observados.[4] Os precedentes são: Clara pregação de Lei e Evangelho, dentro de um plano anual bem traçado, conforme as necessidades da Congregação.[5] A disciplina não é somente trabalho do pastor, mas da congregação, de todos os membros. Isto nos leva à seguinte pergunta: Como está, em nossas (em sua) congregações a compreensão do “Sacerdócio real dos cristãos?[6] Ser sacerdote real é ser cristão; ser cristão é ser sacerdote real. Será que os sacerdotes reais não sabem mais onde é o seu lugar para servir? Eles não conhecem mais suas funções: Ouvir a Deus, falar com Deus, amar os irmãos, exercer seu sacerdócio ali onde Deus os colocou (família, vizinhança, lugar de trabalho, sociedade, e no culto de sua congregação)? O ponto central do trabalho sacerdotal, também da disciplina eclesiástica é abrir os céus aos que nos cercam. Por isso, ao verem um irmão pecar, falem com ele? Disciplina, tanto para o pastor, como para os membros, não é tanto um dever, mas um privilégio, mais precisamente, aconselhamento.
     Por vezes parece que alguns interpretam Mt 18 como um programa de três passos para purificar a congregação. Já encontrei um pastor que em três semanas, por três cartas, seguindo Mt 18, excomungou alguns membros. Interrogado a respeito, respondeu: Segui os passos prescritos por Mt 18. Imaginam.
     Ao lermos Mt 18, precisamos nos perguntar: Qual o contexto e o propósito de Mt 18? Vejam a parábola da ovelha perdida, que antecede Mt 18.15. Isto mostra que o objetivo de Mt 18 não é simplesmente purificar o rebanho das ovelhas puladoras de cerca, purificar a congregação de seus fracos, errantes e obstinados pecadores, mas trazê-los de volta e alegrar-se com sua volta. Mt 18 mostra até onde vai o amor cristão nesta busca do irmão desviado, que caiu. A excomunhão é medicinal, não mortal. (Lutero)[7]
     Lutero escreve a respeito:
         “Deve-se ver o que é a excomunhão da Igreja e qual é o sentido desta palavra. A excomunhão não é outra coisa do que a privação da comunhão e
colocar alguém fora da comunhão dos crentes. Ora, a comunhão dos crentes é dupla: interna e espiritual, outra externa e corporal. A espiritual é uma [só] fé, uma esperança, um amor a Deus. A corporal é a participação em seus sacramentos, isto é, nos sinais da fé, da esperança, do amor. Mas ela se estende mais além, indo até a comunhão nas coisas, no uso, na conversa, na habitação e em outras relações corporais.
   Portanto, assim como nenhuma criatura pode fazer uma alma entrar naquela primeira comunhão, a espiritual, ou, uma vez excomungada, fazê-la entrar de novo – só Deus pode fazê-lo, da mesma forma nenhuma criatura – exceto o ser humano mesmo (a pessoa) através de seu próprio pecado – pode tirar-se esta comunhão ou excomungar-se, cair fora desta comunhão por sua volta ao pecado e persistir nisso, rejeitando as admoestações dos irmãos. 
   Esta opinião é muito evidente, pois nenhuma criatura pode dar-se a fé ou, uma vez caído da fé, voltar à fé, por suas forças. Ao mesmo tempo, ninguém pode tirar a fé que Deus deu e conservá-la, conforme Rm 8.15. 38.  “Quem há de lhes fazer mal, se vocês foram bons seguidores?” (1 Pe 3.13) (Cf.: Obs. Selecionadas, vol. I, pág. 192-3)

Como fazê-lo?  

     Se teu irmão pecar contra ti (ou vires teu irmão pecar), vai argüi-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão (Mateus 18.15 RA).
     A primeira palavra de ação em relação ao irmão faltoso é: “Vai!” Não espere muito. Não te faças de rogado, dizendo: Isso é com ele. Não vou me meter. Ele terá de vir a mim. É teu irmão que está em perigo, vai e fale com ele.[8]  Não fale a outros do que você viu ou ouviu. Vai e  fale com ele sozinho, não para degradá-lo, humilhá-lo, mas para ganhá-lo. Fale com ele a sós, onde ele possa se defender e vocês podem dialogar tranquilamente. Fale com ele o tempo que for necessário e quantas vezes forem necessárias. E, se tudo parece ser em vão, então dê o segundo passo e busque auxílio, levando dois ou três irmãos consigo.[9] O assunto de que se trata: o pecado do teu irmão, deve ficar bem claro. Não pode haver discordância, diferença de opinião ou interpretação, nem má compreensão a respeito. No diálogo tudo deve ser esclarecido.
    Um pastor deu o seguinte exemplo sobre a questão da clareza. Numa comunidade havia duas irmãs gêmeas que tiveram nenês e não vieram batizá-los. O pastor foi falar com elas. Uma respondeu: Meu marido é batista e não quer batizar a criança, só apresentá-la para orarmos por ela. A outra respondeu: Eu não creio no batismo. Na conversa, veio à tona que aquela família, na verdade, não cria em Deus. Aparentemente, as duas pareciam estar em pecados iguais: não batizarem seus nenês. Mas havia uma grande diferença entre as duas. Uma família era cristã, mesmo sendo o pai da criança batista; enquanto que a outra família não era cristã. Ao tratarmos com um irmão sobre pecados, tudo deve ficar as claras.
     Quando, após muitas reuniões e esforços, não se consegue levar o irmão ao arrependimento, segue o terceiro passo: Diga-o à Igreja. Dos detalhes disso, trataremos logo mais adiante. Isso é mais uma tentativa para trazer o irmão desviado ao arrependimento, de volta ao rebanho, o que também leva o seu tempo.
     E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano (Mateus 18.17 RA).
     Dize-o à igreja. Quem é a igreja? Normalmente o assunto vai para a Assembléia dos membros votantes, onde hoje, na maioria das Comunidades as mulheres também votam. E, conforme os estatutos, somente aqueles membros que são habilitados como votantes. O termo “igreja” (ekklesia), no entanto, aqui não deve ser limitado aos assim chamados “membros votantes – como termo jurídico”. Aqui não se trata da simples exclusão da igreja como sociedade, mas da aceitação ou exclusão no corpo de Cristo. Trata-se de uma questão de vida ou morte espiritual, de salvação ou perdição. Por isso é importante que toda a congregação[10] participe. A alma de um irmão, uma alma imortal está em perigo. Por isso, quando o assunto é levado para a igreja, isto é mencionado pelo pastor e nas orações a congregação.  
     Considera-o como gentio e publicano. O que significa isso? Quando a Comunidade excomunga alguém, a pessoa não está entregando aquela ao diabo, como na Idade Média. A razão da exclusão não é em si só o pecado, mas a persistente impenitência em relação a um pecado grosseiro (ou mortal) ao lado do qual a fé não subsiste. Aqui não se trata de um pecado de fraqueza; não de una infração de leis humanas, mas de um pecado que nega uma doutrina fundamental ou de um pecado contra a moral, ao lado do qual a fé não subsiste. Por exemplo: Um assassino, um adultero, um blasfemador, etc. 
    Como devemos tratar a pessoa excluída? A Comunidade aplica-lhe uma rejeição pública. Em que sentido? Para simplesmente afastar a pessoa do seu meio? Não. Ela se afasta dele, isto é, o suspende da santa Ceia, para mostrar a gravidade do seu pecado, a fim de leva-lo ao arrependimento. Este é o sentido da “excomunhão”.  A razão da excomunhão de um congregado, não é simplesmente purificar a congregação, livrar-nos de um problema.  Guardemo-nos de tal procedimento. Para compreendê-lo, precisamos olhar como Jesus tratou os publicano e gentios. Vejam como Jesus tratou o coletor de impostos? (Mt 9.10-13; 11.19). Como Jesus tratou Pilatos? (Jo 18.33-40). Jesus curou os doentes dos gentios, tomou refeição com os publicanos e hospedou-se em suas casas. Tratou-os como prospectos missionários. O apóstolo Paulo escreve: Se algum dentre os incrédulos vos convidar, e quiserdes ir, comei de tudo o que for posto diante de vós, sem nada perguntardes por motivo de consciência (1 Coríntios 10.27). O apóstolo Paulo detestava os pecados dos gentios, mesmo assim podemos ser amigo dos pecadores. O próprio Jesus chamou a Judas de amigo (Mt 26.50). Quando uma pessoa é excomungada da Comunidade, você não está construindo um muro entre você e ela. O pecador é que se afastou. Você está dizendo a esta pessoa que está esperando sua volta de braços abertos e a pessoa deve sentir isso. Disciplina – como disse um pastor – é comunicação de alma a alma. Não é simplesmente uma obrigação do pastor, mas um privilégio do pastor e de todos os sacerdotes reais, da nação santa para, pela administração do Ofício das Chaves, que visa abrir o céu às pessoas. Pelo anunciar a lei de Deus, mostramos ao pecador o quão afastado ele está de Deus, que ele está num caminho errado. E quando o disciplinado pergunta, como no dia de Pentecostes: Que faremos, irmãos? Pedro respondeu: Arrependei-vos, e cada um de vos seja batizado em nome de Jesus Cristo, para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo (At 2.37-38). Desta forma queremos tratar o irmão ou irmã excomungado, anunciando-lhes lei e evangelho.

Disciplina e evangelismo
     Em nossas congregações há a preocupação com o evangelismo, o crescimento da igreja, e também a preocupação com a evasão de nossas congregações, daí o programa: Feche a porta dos fundos. Quando este programa surgiu – o livro tem na verdade coisas boas – eu tive uma preocupação. Vocês sabem que coisa terrível é uma prisão de ventre. Quando pastor mais jovem, perdi duas famílias na comunidade que foram para outra denominação cristã. Eu estava muito chateado, sim, triste. Naqueles dias, um pastor aposentado veio me visitar. Falamos sobre o assunto. Eu tinha essas pessoas como cristãs e bons membros. Eles se incomodaram com algumas coisas na Comunidade e saíram. Para minha surpresa o pastor aposentado disse: - “Que bom que eles têm outra opção. Que a porta dos fundos está aberta.”[11] Nisto outro membro bateu na minha porta. Era um destes membros cricri, que eu desejava ver longe. Ele nos cumprimentou e derramou seu fígado, contra mim, contra coisas na Comunidade e da Igreja em geral. Após o que, ele foi embora. Meu colega riu. Eu lhe disse: - Este eu gostaria que fosse para a outra igreja. – Não, não, disse meu colega. Agradeça a Deus também por ter um membro assim. Agradecer a Deus? – Sim, respondeu ele. É um bom alerta. Ele te faz refletir e reexaminar as posições. Isto sempre é bom e necessário. – Respondi: Mas eu posso fazer o que quiser. Se eu digo sim, ele diz não. Se eu digo não, ele diz sim. Se não respondo, ele fica bravo; se respondo, ele se torna violento. Se rio, ele acho que estou gozando dele. – Vai com calma, me disse o colega. Então a nossa conversa passou para o assunto dos distanciados. E ele me disse: Evangelismo e uma moeda que tem dois lados: Ir para fora – e ao mesmo tempo corrigir a Comunidade por dentro.
     Em nosso mundo rodeado de seitas há uma busca por membros. Todos se esforçam para ganhar membros e facilitam ao máximo sua entrada. Resultado é que, com a mesma velocidade com que vieram, eles também vão embora. E mesmo que muitos ficam, notaremos muitas vezes que não são cristãos dedicados. Eles encaram a congregação como um clube, como se dissessem: Afinal, é bom ser membros de uma igreja. Para muitos: Ser membro é sinônimo de ser salvo, independente de sua fé e vida espiritual. Antigamente, muitos permaneciam membros, só para terem direito ao cemitério. Portanto, muito cuidado com o evangelismo. As pessoas que vem devem ser bem instruídas antes de serem aceitas. E a pergunta tão importante quanto a do evangelismo é: O que fazemos com membros nossos que há muito tempo não vêm mais aos cultos, nem à Santa Ceia. Se examinarmos nosso Rol de Membros, quantos bêbados, pecadores manifestos, que não lêem a Bíblia, não fazem devoções, etc. continuam no nosso rol de membros? Onde está a honra cristã de serem sacerdotes reais, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus (1 Pe 2.9). Eis uma das razões porque a Igreja Cristã perdeu sua força atrativa. Nossos membros não sabem mais manejar o Ofício das Chaves nem dentro da congregação, nem para fora.
    Em anos passados, eu tinha feito um plano de trabalho de dois anos para atuar sobre os distanciados de nossa Comunidade. A Diretoria da Comunidade – sem dar muita atenção ao plano - o aprovou. Mas já nos primeiros meses surgiram críticas, encaminhadas à Diretoria. O assunto foi debatido, então me dei conta que faltou uma coisa. Nem a Diretoria nem os membros tinham plena noção do que significa o Ofício das Chaves. Tive que recolher o plano e começar a fundamentar o assunto. Isto me levou a dar mais atenção, nos meus sermões, ao terceiro uso da lei[12] e à vida santificada. Apesar de tudo isso ser evangelho, tive que ouvir, como Jesus, a acusação: É duro este discurso (Jo 6.60). Você quer destruir a Comunidade! Etc. Há perdão para todos. O verdadeiro amor, porém, requer que os pecadores manifestos e não arrependidos[13] sejam admoestados e se não se arrependem, disciplinados.
     Isto abre a reflexão para o lado do evangelismo que começa com a disciplina (buscar, aconselhar, disciplinar, excomungar) daqueles que por um longo período de tempo são membros da congregação, mas que não dão evidências de vida espiritual cristã. Que são surdos à Palavra de Deus, que não têm tempo para Cristo e sua igreja, que vivem em pecados. Qualquer esforço para evangelizar os de fora conflita com o mau testemunho dos membros da Comunidade, que é confuso. Visto que no evangelismo chamamos as pessoas ao arrependimento e à fé, enquanto que muitos membros na Comunidade vivem de forma diferente, não vivem em verdadeiro arrependimento e fé. Isto desacredita o evangelismo, pois não faz sentido se não partirmos da premissa de que pecadores (dentro e fora da Comunidade) devem ser chamados ao arrependimento e à fé em Cristo. Onde a Comunidade (Igreja) não se preocupa em chamar os pecadores em seu próprio meio ao verdadeiro arrependimento, os de fora ficarão com a imagem distorcida, como se a salvação vem, simplesmente, pelo filiar-se à congregação.
     Se o testemunho da igreja ao mundo e a de seus membros deve ser efetivo, a Comunidade deve estar preocupada com respeito àqueles que estão se enganando a si mesmos, pensando que tudo está bem, porque são membros de uma igreja, quando na verdade, estão espiritualmente mortos. É necessário mostrar a tais pessoas o que é absolutamente claro de que eles estão fora do Reino de Deus se não se arrependerem e se tornarem membros vivos do Reino de Deus, pela fé em Cristo Jesus. A excomunhão faz exatamente isso. Ela informa a pessoa que a igreja só tem uma esperança a oferecer a pecadores, a saber: Quem crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado (Marcos 16.16 RA). Ela prega fielmente que Jesus morreu e ressuscitou e voltará para julgar vivos e mortos. A igreja Luterana não tem parte em servir de travesseiro para falsas esperanças. Ela precisa colocar toda a falsidade de lado e chamar pecadores em seu próprio meio e os de fora ao arrependimento e fé em Cristo. Desta fé brota uma vida nova em Cristo. O próprio Jesus disse que devemos considerar como “publicanos e gentios” os que não querem ouvir sua voz, isto é, considerá-los objetos de missão. Em congregações muito decaídas o pastor, em vez de ser cura de almas, precisa ser, muitas vezes, em primeiro lugar, um missionário dentro da Congregação.  
    Este é o propósito da disciplina e excomunhão, não simplesmente purificar a igreja, mas salvar almas, tanto as que estão na igreja, como aqueles que se consideram membros dela, mas não vivem a fé, bem como os de fora, que ainda não conhecem a Cristo.

III - A Excomunhão na prática

Introdução

     Excomungar alguém da Comunidade só é possível ali onde a Comunidade está instruída a respeito do Ofício das Chaves – não somente o pastor – mas todos os membros. Onde os membros estão engajados no aconselhamento, na admoestação fraternal, na luta pela salvação das pessoas.
     Lutero escreve: “A excomunhão não deve ser dada nem tirada por qualquer ser humano, seja ele bispo ou Papa, sim, nem mesmo por um anjo ou qualquer criatura. Unicamente o próprio Deus, através do seu santo Espírito, tem que derramá-lo no coração da pessoa que crê no sacramento... Assim, aqui também não pode chegar nem existir nenhuma excomunhão, a não ser tão somente a descrença ou o pecado da própria pessoa. Ela pode excomungar a si mesma com isto e, assim separar-se da graça, vida e bem-aventurança da comunhão. O apóstolo Paulo afirma: Quem pode nos separar do amor de Deus?” (Rm 8.35,38. Obr. Sel., vol. II, pág. 240,241).
     Pessoalmente tive que enfrentar alguns casos de disciplina eclesiástica com exclusão. Na maioria das vezes admoestava as pessoas com amor a paciência, com dois resultados: Ou ganhava a pessoa de volta ou ela mesma, incomodada, pedia seu desligamento ou abandonava a congregação.[14]
Passos do Processo

Procedimentos iniciais

1.     A lei do amor. O propósito de uma admoestação e disciplina é o amor, ganhar a pessoa para Cristo. Pregamos lei e evangelho, mas
cuidado. Quando pregamos a lei não o fazemos com o dedo em riste, com certa raiva e desdém, mas pregamos também a lei com amor. A pessoa deve notá-lo.

2.     Procedimento. Se houve uma ofensa pública, isto é, o pecado grave de um irmão que se tornou público, tornou-se uma ofensa pública,
então seguem-se os passos de Mateus 18.15-20.

-  a) O irmão que foi ofendido[15], ou que tomou conhecimento do pecado grave do irmão, pecado mortal[16],[17], por temer pela salvação do irmão, vai a ele sem demora, para lhe perguntar e falar a respeito. Não somente uma vez, mas várias. Quantas forem necessárias.

- b) Caso o irmão não reconhecer seu erro, toma-se duas ou mais pessoas consigo. Estas pessoas devem ser cuidadosamente escolhidas. Elas devem ser aceitas pelo irmão faltoso e devem ser pessoas de respeito na congregação. Fará a pergunta ao irmão sobre o seu pecado. O acusado tem direito de explicar e se defender. Se as pessoas convidadas se convencem do erro do irmão, procurarão ajudar a convencê-lo do erro (ou, se for o caso, inocentá-lo do mesmo). Isto leva seu tempo. Por vezes são necessárias várias reunião, muita paciência e persistência.

- c) Se não houver progresso, levarão o assunto à diretoria da Comunidade que tratará com ele, quantas vezes for necessário. Se notar que o irmão é impenitente e não quer reconhecer seu erro, após várias admoestações em amor, levarão o assunto à Assembléia dos Membros Votantes. Eles deverão julgar o caso e, ao se convencerem do erro do irmão, tendo-o admoestado mais de uma ou mais vezes.  A assembléia o admoestará. Isso poderá acontecer por várias assembléias. Se não houver resultado será excluído da congregação pela assembléia. Isto deverá ser por voto unânime. A resolução deverá ser ratificada por uma segunda Assembléia. Se após um tempo a pessoa se arrepender poderá ser novamente aceita.

3.     Formas corretas do processo. No seguir Mateus 18 devemos ter os seguintes cuidados:
a)    Ao falarmos com o irmão, que caiu em pecado grave, não devemos perder de vista o propósito supremo, a saber, o bem-
estar espiritual do nosso próximo e a glória de Deus. O irmão não deve ser exposto ao escárnio e ao ridículo “dos de fora”.  Devemos cuidar para não falar motivados por ira, malícia, ou vingança. Sabemos que no trato desses assuntos, facilmente as discussões, especialmente quando o assunto chega à Assembléia dos Membros Votantes, pode descambar para palavras ásperas e violentas e um clima amargo, devido a vários fatores: parentesco, partidos, etc. Nesses casos o presidente da Assembléia deverá suspender a reunião, para apaziguar os ânimos. A reunião poderá ser reaberta após uma hora ou então convocada para a próxima semana.
b)    Pecados ocultos. Pecados ocultos não devem ser publicados, a não ser que o caso já esteja no terceiro grau de admoestação fraternal.
c)     Certeza. Devemos ter certeza de que não se trata de um pecado de fraqueza da vida diária, mas de um pecado grave que gera ofensa e escândalo. Na conversa com o irmão isto deve ficar claro que a fé não subsiste ao lado de tais pecados. Precipitação. Não devemos ser precipitado. Tome e tenha tempo para o tratamento com o irmão. Se a disciplina eclesiástica não for antecedida por um processo de pacienciosa admoestação fraternal, todo o processo cai por terra, porque não seguiu os três passos.  Pv 25.11; 1 Sm 25.36,37.
d)    Lembre suas próprias fraquezas. Ao admoestar o irmão não o faça com espírito de superioridade. Não somos melhores. Lutamos pela salvação do irmão.
e)     Nos mesmos pecados. Quem quer corrigir não deve estar vivendo nos mesmos pecados, Lc 6.41,42.
f)      Forma. Nem tímido nem severo, 1 Tm 3.1,2.
g)    Considerações. Coisas que devem ser levados em conta: grau de inteligência, experiência de vida, conhecimento da Escritura, condições físicas, e o ambiente em que vive o irmão, etc.    
h)    Gravidade dos pecados. - Nem sempre é fácil definir se um pecado realmente é grave ou não. A maioria dos pecados só é digna de repreensões. O rei da Prússia, Frederico o Grande (1712 – 1786) perguntou a seu pastor: Por que nós homens públicos pecamos tanto? Realmente homens públicos, administradores, políticos – especialmente hoje – estão sendo sempre criticados, acusados e de fato há sempre muitos erros numa administração. Não propositalmente, mas devido às circunstâncias e tentações. Sofrem processos trabalhistas e contábeis, etc. O pastor e a comunidade devem cuidar muito para não acusá-los indevidamente. Pois pecados graves são pecados obstinados contra a moral (não simples erros administrativos, por mais prejuízo que por vezes tenham causado), erros persistentes que são uma negação da fé. Há muitas vezes casos bem duvidosos, os quais temos que deixar nas mãos de Deus.  
i)       Boatos. Por vezes surgem boatos contra irmãos, especialmente dirigentes na Comunidade. As razões podem ser as mais diversas. Boatos ainda não são fatos. Se os boatos difamatórios são muitos fortes e amplamente comentados na Comunidade contra um irmão, o pastor deve tomar uma ou duas testemunhas. Convidar o irmão para uma conversa. O informará sobre os boatos e lhe perguntará o que ele tem a dizer a respeito. Se ele negar os boatos e não havendo prova nenhuma, o assunto estará encerrado. O pastor poderá informar a Comunidade que a Diretoria falou com o irmão e não há provas.      
j)      Diversos encontros. Cada passo de Mt 18 pode ter vários encontros. Se notarmos que a pessoa está triste, agiremos com mais vagar, Mt 18.22; Lc 17.3,4.
k)    Quando amplamente manifesto. Quando o pecado de um membro é tão manifesto que toda a congregação se escandaliza, não é necessário seguir os três passos de Mt 18. Podemos chamar a pessoa como o apóstolo Paulo o fez com Pedro. (Gl 2.13,14; 1 Tm 5.20. (Pastorale, Walther, tese 40. Obs. 3[18]).

4.     Ofensa pública. Quando há uma ofensa pública, tendo o caso  sido tratado com a pessoa  uma ou mais vezes pela Comunidade, e a
pessoa mostrar arrependimento, ela não deve ser excluída, mas deve por uma desculpa pública remover a ofensa. Esta desculpa pública não é um castigo, mas demonstração de que o ofensor é penitente, (Mt 18.15; 5.23,24; Lc 17.3,4). Caso contrário a Comunidade daria a impressão de que a pessoa pudesse continuar a viver em pecado.  Os pecados públicos que requerem uma desculpa pública são pecados graves. Roubos, blasfêmias, adultérios, etc. No caso de pessoas dominadas por vícios como o álcool ou drogas, que muitas vezes lamentam seu estado, mas têm recaídas freqüentes, a Comunidade deve ser informado pela diretoria de que tais pessoas estão em tratamento.

5.     Forma da desculpa pública. O bom senso da Comunidade deve
determinar como a desculpa será feita ou encaminhada. Se a pessoa deve comparecer pessoalmente, quer diante da Diretoria ou diante da Assembléia da Comunidade, ou se o pastor lerá o pedido encaminhado, ou o proclamará verbalmente.

O processo de Excomunhão

1.     O processo da Excomunhão. Que pessoas podem sofrer o processo de disciplina?
a)     Pessoas em vida, não pessoas falecidas, como houve casos no
passado.
      b) Pessoas que não podem ser responsabilizadas por seus atos,   
          não podem ser  excomungadas como insanos, débeis mentais,
          pessoas possessas pelo diabo.
b)    Pessoas que ainda se consideram nossos irmãos e irmãs na fé,
(1 Co 5.11; 1 Jo 2.19). Pessoas que abandonaram a Congregação não podem ser disciplinadas.
c.  Pessoas que são membros comungantes ( 1 Co 5.13), crianças  
     ou jovens ainda não confirmados, não, estão sob a
     responsabilidade de seus pais,  (Ef 6.4; Dt 21.18-21).
d)  Pessoa que cometeu pecados graves pelo qual a pessoa caiu da
      fé, pecados mortais[19], (1 Co 5.11; Jo 13.21,22; 2Co 12.21). Aqui
      temos dois campos: - alguém que nega uma doutrina
      fundamental da fé cristã, necessária para a salvação, como por     
     exemplo: negar a  Cristo, sua expiação vicária, sua morte e
     ressurreição, etc. (Jo 8.42-46; Mt 23.23,33; Rm 16.17,18); o outro
     campo – pessoa que cometeu um pecado público contra a moral
    cristã, por exemplo: assassinatos, divórcios, incestuosos, roubos,
    perjúrias, blasfêmias,  beberões, etc. Confira as passagens: Sl 58.1;
    1 Tm 5.20; 1 Co 5.11; 2 Ts 3.14; 2 Jo 7-11);
e) A pessoa que se mostra incorrigível e incrédula e que apesar de
     toda a admoestação persiste em seus pecados ou erros de
    doutrina  (Mt 18.17). O que deve estar manifesto não é
    simplesmente o pecado, mas a impenitência, o permanecer nos
    pecados;
 f) Pessoa que desrespeita as autoridades da congregação, isto é,
     diversas vezes e continuamente, mesmo após admoestações. Não
     é o fato de alguém que numa assembléia, explode por seu caráter
     tempestuoso,  de pavio curto.
 g) Não uma pessoa por sua falta de conhecimento, pequinês de fé
     ou pecados de fraqueza.
           h) Uma congregação inteira não pode ser excomungada. Não há
               autorização  para tal, nem deve ser feito. Porque onde a palavra de
                 Deus está sendo pregada, ela traz seus frutos. Somente o irmão
                 impenitente, individualmente,  pode ser excomungado.

 Obs.: “Excomungar por causa de dinheiro ou de outras coisas temporais é uma invenção nova, da qual os apóstolos e Cristo nada sabiam. (Lutero. Obr. Sel. vol.II, pág. 242). Esta frase de Lutero refere-se a pequenas coisas. Na Idade Média puniam-se pecados como roubar um porco, não pagar uma dívida, enquanto os grandes barões eram inocentados. Mesmo assim isto vale ainda hoje: Não por erros administrativos, mesmo com grandes prejuízos financeiros (exceto se forem roubos claros). Administradores são responsabilizados e demitidos.

i)       Pessoas que estão em processo judicial são aconselhadas (não
           obrigadas) a não participarem da Santa Ceia, enquanto corre o
           processo. Só após o processo julgado, o assunto poderá ser tratado  
           se necessário, pela Comunidade. Não podemos nos antecipar ao  
           judiciário e julgar arbitrariamente. Nesta área acontecem muitas 
          injustiças. Por vezes, cristãos os sofrem e precisam exatamente
          nestas horas da Comunidade e da Santa Ceia, para seu consolo e
         força.

2. Unanimidade e protesto contra a excomunhão. Visto que a excomunhão deve estar firmada em base bíblica e a Bíblia é clara em
definir o que é um pecador impenitente, a votação para a exclusão de um membro deve ser unânime.
    O argumento bíblico é o seguinte: Se uma comunidade seguiu os passos bíblicos e ficou evidente que a pessoa a ser excomungada é um pecador impenitente que, após todo o processo paciencioso de admoestação fraternal em amor, insiste em sua impenitência e, portanto, caiu da fé e está sob juízo de Deus, o qual a comunidade lhe demonstrou por este processo, então o votar contra a exclusão seria votar contra a decisão de Deus. A pessoa que votar contra coloca-se ao lado da pessoa em processo de excomunhão e corre o risco de ser também disciplinado.
     Ultimamente são levantadas objeções a isso. Por exemplo: Será que o voto de uma ou duas pessoas que - por falta de um conhecimento maior, fraqueza e/ou falta de maior sinceridade, ou parentesco – votar contra a excomunhão de uma pessoa, pode impedir o veredicto de uma congregação inteira que luta em amor pela salvação de uma alma? Não deveria esta discordância ser tratada mais evangelicamente na esperança de que, dia mais dia menos, esta pessoa que protesta chegue à compreensão do ato da Congregação, mas não o impeça neste momento? Outra coisa é se várias pessoas, um grupo se opõe e discorda da ação da Comunidade. Neste caso o ato deve ser interrompido e o grupo deverá ser mais esclarecido e instruído.
     Neste assunto deve se ter muito cuidado. Excluir alguém por simples voto de maioria, sem unanimidade, normalmente abre uma ferida dolorosa na comunidade, partidarismo, antipatias contra o pastor e a diretoria, difícil de curar. É preferível não precipitar a exclusão, mas ter paciência até obter a unanimidade.   
      Nenhuma resolução de excomunhão pode ser aprovada enquanto houver uma pessoa do contra (um protesto). A votação deve ser unânime.[20] A aprovação deve ser ratificada numa segunda Assembléia uma ou mais semanas após. – O caso da exclusão dever ser tão claro para todos os membros, que cada cristão na Congregação possa ver a justiça da mesma. Uma resolução que não for unânime não é válida.[21] – Pode acontecer também que alguém proteste sem razão suficiente ou por outros motivos escusos, como por amizade, parentesco ou desrespeito à Palavra de Deus. Nesses casos deve se tratar, em primeiro lugar, com a pessoa que protesta antes de continuar o caso de exclusão. Se a pessoa que protesta não aceitar a Palavra de Deus, ela deve ser colocada em disciplina e se necessário também excluída. Se os que discordam ou protestam são diversos (muitos), e a Diretoria da Comunidade e o pastor não conseguem convencer os que discordam, mesmo sendo um grupo pequeno, o processo dever ser suspenso. Talvez a Comunidade deva ser melhor instruída sobre o assunto da Disciplina Eclesiástica, ou pelo menos o grupo que está protestando.
     A exclusão de um membro por maioria dos membros presentes na assembléia, não importa quão grande, e não por unanimidade é inválida e ilegítima.
     Walther escreve a respeito: “Visto que, conforme a palavra de Deus, a excomunhão ser uma questão de toda a congregação, ela não pode ser levada a efeito por mera maioria dos membros votantes, mesmo que essa seja expressiva. Visto Jesus ter ordenado a excomunhão e o apóstolo Paulo ter repreendido a comunidade de Corinto por tê-la omitido, num caso óbvio (1 Co 5.10-13), a pessoa comete um grave pecado se ela se opõe, numa caso óbvio... (Pastorale de Walther, tese 42, obs. 3).

3.     Advertência. Antes de se instituir a disciplina eclesiástica e insistir  
numa confissão pública de pecado, o pastor e a diretoria devem ter
certeza de que tal pecado realmente foi cometido e a pessoa em foco é um pecador impenitente que precisa ser colocado em disciplina eclesiástica. A disciplina eclesiástica não lida simplesmente com pecadores, mas pecadores impenitentes. Se o pastor ou a Diretoria da Comunidade precisam, no meio do processo recolher o processo por falta de provas ou clareza, ou até de falta de conhecimento da doutrina da Disciplina Eclesiástica da Comunidade, isto prejudicará o pastor e a Diretoria e aborrecerá os membros da Assembléia. - Pode acontecer que o pastor esteja convencido da necessidade de disciplinar certo irmão, mas não consegue convencer a Diretoria ou a Comunidade de tal. Nesse caso é aconselhável o pastor e a Diretoria consultarem um pastor mais experiente, ou o Conselheiro Distrital para examinar a situação e se aconselhar. (1 Co 5; 1 Co 6.1-8; 1 Tm 5.20) Nunca deve se ter pressa nesses assuntos.

4.      Legalismo. O pastor deve cuidar para não se tornar legalista durante o processo. A ele cabe agir de forma evangélica.

5.      A notificação ao ofensor. – Ao se convocar uma Assembléia para tratar da Disciplina Eclesiástica, isto deve constar claramente na
Ordem do dia da Assembléia e publicado com antecedência, para que todos os membros tomem conhecimento do fato.
      Mesmo não sendo absolutamente necessário, é aconselhável que o ofensor seja notificado por escrito a respeito de sua convocação para a Assembléia dos membros Votantes, que tratará do seu caso. Duas pessoas da Comunidade serão encarregadas para entregarem pessoalmente a carta de convocação. Eles pedirão que a pessoa convocada assine a segunda via, atestando o recebimento da convocação. Quando isso não for possível, a convocação seguirá por correio. Solicitarão a confirmação do recebimento e aguardarão a resposta. Se a pessoa envolvida no processo se recusar comparecer à Assembléia, ela não poderá ser tratada conforme Mateus 18 e excluída. A convocação deverá ser repetida. Se a pessoa não vier, ela será considerada como pessoa que abandonou a congregação e/ou que se exclui a si mesma (1 Jo 2.19). Neste caso, só se fará uma declaração pública de que tal pessoa abandonou a congregação, que daqui para frente será tratada como um não membro. Neste anúncio não poderá constar que o ofensor foi excomungado ou se excomungou a si mesmo, nem mencionado o pecado que deu motivo para a tratativa, pois não houve processo. A não ser se o pecado, a ser tratado com ele, for um grave pecado moral, de conhecimento público, neste caso poderá ser dito que a pessoa foi convocada para prestar contas do seu comportamento moral (sem mencionar qual), mas preferiu não vir e abandonou a congregação. Se um ofensor prometeu vir, mas não veio, ele deverá ser convocado novamente, mesmo que haja rumores de que ele não veio propositadamente. Na reunião de disciplina, todos os membros da Comunidade, mesmo aqueles membros confirmados que ainda não adquiriram seu direito de membros votantes podem estar presente, inquirir, opinar e votar. Isto, mesmo que conste nos estatutos da Comunidade, de que somente membros votantes podem votar. Algumas congregações, devido a gravidade do caso, não permitem o voto aos não votantes, mesmo que respeite eles o inquirir e opinar, respeitando inclusive seu protesto. Pois aqui não se trata da simples associação que é regulamentada pelo regimento, mas se trata da situação de um membro da Igreja Cristã.
  
6.      Ratificação da excomunhão. Visto que o poder de excomunhão foi dado à congregação (Mt 18.17; 1 Co 5.2,4,13), uma resolução não é
válida se o direito não for dado a todos os membros da congregação manifestarem sua aprovação ou desaprovação. Por isso a resolução da excomunhão de um membro não será válida se não for ratificada numa segunda Assembléia convocada para esse fim, para deixar bem claro a aprovação unânime.[22]

7.      Minuta da Excomunhão. A minuta (Ata) da congregação com respeito à excomunhão deve ser redigida com muito cuidado. Ela
deve indicar de forma clara a razão da excomunhão. Pois qualquer congregação ou o Sínodo poderá solicitar uma cópia para se certificar da retidão do processo, para que a excomunhão possa ser honrada por todas as congregações do Sínodo e Sínodos em comunhão conosco. Por esta razão a ata, ou minuta do caso deve ser cuidadosamente redigida em todos os detalhes.

8.      A carta de exclusão. A carta que comunica e anuncia a excomunhão de um congregado também deve ser cuidadosamente
redigida, como um documento oficial da congregação. A carta será entregue por dois membros à pessoa disciplinada, que deverá assinar a segunda vida, atestando o recebimento da mesma. A carta de exclusão de um membro deve ser lida pelo pastor na Comunidade e também na próxima assembléia e arquivada. O teor deverá ser mais ou menos o seguinte: Estimados irmãos e irmãs. É meu dever como pastor (ou presidente) desta Comunidade anunciar que na Assembléia dos membros votantes de nossa congregação, realizada no dia 10 de novembro de 1923, neste recinto, (rua, número, cidade), às 10h da manhã, foi tratado o assunto disciplinar do nosso irmão J. E. Seguiu-se a ordem estabelecida por Cristo em Mateus 18. O tratamento durou um ano e três meses. Infelizmente, após tantas reuniões de aconselhamento, o irmão J.E. não se deixou mover ao arrependimento, nem pelos membros da comunidade. Ele foi excluído por unanimemente. A exclusão foi ratificada unanimemente também na Assembléia do dia 17 de novembro ano em curso. Sendo o principal motivo sua impenitência. Maiores detalhes estão arrolados na ata da Comunidade. Este ato não visa sua ruína ou desgraça, mas é uma manifestação unânime de amor para mover o irmão (ã) ao arrependimento, para que dê lugar à graça de Cristo. Não deixemos de orar pelo irmão, para que Deus Espírito Santo abra seus olhos e seu coração, o conduz ao arrependimento e de volta ao rebanho. Ao mesmo tempo lembremos nossas fraquezas e a advertência do apóstolo: Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca (Marcos 14.38).

9.      A exclusão é válida em toda a igreja. Se uma congregação exclui um membro, isto vale em toda a Igreja (Sínodo). A
Congregação prestará voluntária e pronta informação a qualquer comunidade do Sínodo que solicitar informações a respeito. Por essa razão todo o processo deverá estar bem registrado em ata. Pois qualquer congregação tem o direito de solicitar a ata para se certificar da retidão da exclusão.

10.  Apelação. Se uma pessoa que for excluída não concordar com a exclusão por sua congregação, a IELB possui a Comissão de
Apelação à qual a pessoa pode recorrer e pedir a revisão de sua exclusão. Como nestes casos muitos fatores locais e humanos podem se imiscuir num processo de exclusão, uma comunidade não pode se negar de ser submetida à Comissão de Apelação, nem deve-se ofender com isso. Antes concordar, pois deseja que tudo seja feito em ordem com a Palavra de Deus. A Comissão de Apelação da IELB, examinado o caso, formará sua opinião. Chamará a pessoa que solicitou a revisão e a Diretoria da Comunidade e manifestará a ele seu parecer. A Comissão como tal não está sobre a Comunidade, não tem poder de excluir um membro ou levantar uma excomunhão, isto cabe somente à Comunidade, que normalmente acatará a decisão da Comissão de Apelação.    
    

11.  Atitude cristã em relação a um excomungando. Há uma diferença
entre uma pessoa excluída por questão doutrinária e de uma pessoa excluída devido ao seu comportamento moral.  a) Pessoa excluída por questões doutrinárias é considerada não mais nosso irmão confessional, mesmo assim, dependendo do caso[23], continua sendo um cristão, e como tal não o consideramos um “gentio”;  b) enquanto que uma pessoa excluída por pecados grosseiros, impenitente é considerado um “gentio e publicano”, portanto “um prospecto missionário”.
        Nossa atitude para com uma pessoa excluída por sua impenitência deve deixar isso claro: Ele não é nosso irmão na fé enquanto não se arrepender (2 Ts 3.15). Uma atitude que dê a entender de que nós não respeitamos a decisão da Comunidade, deve  ser evitada. Mesmo assim, a excomunhão não perturba as relações humanas naturais, como por exemplo: marido e mulher, pais e filhos, patrão e empregado. As portas da igreja também não estão fechadas a um excomungado. Não fechamos as portas da Igreja a ninguém que queira ouvir a Palavra de Deus; um excomungado, no entanto, é impedido de participação na Santa Ceia, enquanto não se arrepender e regularizar sua situação com a comunidade. A congregação não deixará de orar por ele, e os membros lhe mostrarão, em amor, que lamentam seu afastamento e o desejam de volta.

12.  Casos bem especiais. O apóstolo Pedro afirma: Não sofra, porém, nenhum de vós como assassino, ou ladrão, ou malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outrem (1 Pe 4.15). Mesmo assim não faltam situações semelhantes em nas melhores comunidades cristãs. Como tratar desses casos?
    Do Antigo Testamento lembramos o caso do rei Davi: Adultero assassino, em sua hipocrisia por um bom tempo impenitente, até ser advertido pelo profeta Natã (2 Sm 11 e 12); e o grave caso do rei Manassés: assassino, idólatra, blasfemador, que se arrependeu na prisão e Deus o reempossou (2 Rs 21.1-18; 2 Cr 33.1-20). Nos livros Apócrifos temos sua Oração de Arrependimento. Infelizmente casos semelhantes se repetem ainda hoje na Igreja Cristã. Cristãos que erraram gravemente, quer num momento de ira assassinaram alguém, roubaram, defraudaram são julgados e condenados à prisão pela justiça civil.
    No livro: Seelen-Hirte de Haas temos um capítulo de como o pastor deve tratar dessas pessoas na prisão e/ou, como costume antigamente e ainda hoje em alguns países, condenados à morte (fuzilamento, cadeira elétrica, forca, etc., como acompanhá-lo até o cadafalso, com exemplo de orações.
     A nós interessa como tratar essas pessoas pastoralmente. É nosso dever assisti-los, mesmo se forem aprisionados, assisti-los na prisão. Ao se arrependerem, absolvê-los e confortá-los, mesmo se são difamados, perderem todos seus bens e tenham que cumprir sua pena na prisão. Ao se arrependerem – em caso de terem sido excomungados – declarar isso diante da Comunidade e recebê-los, aceitá-los novamente como membros.  


14. Readmitindo um excomungando. Quando um excomungando chega ao arrependimento e à fé e pede para ser novamente recebido
na congregação cristã, como devemos proceder?[24] A Comunidade se alegra por um pecador que se arrepende.[25] Muitas vezes a Diretoria terá que lutar contra desconfianças a respeito da intenção da pessoa que retorna.[26] Tudo isso requer amor no tratamento ao que retorna. Visto que o pastor não excomunga ninguém por conta própria, ele também não aceita ninguém por conta própria.[27] Com alegria o pastor recebe o pedido e o encaminha para a Diretoria, a qual marcará um encontro com o excomungando. Neste encontro procura se certificar – até onde isso é humanamente possível – da seriedade do pedido. Então a Diretoria encaminhará seu pedido à Assembléia dos membros votantes. Se o pedido for aceito, e isso também por unanimidade, o pastor o comunicará à Comunidade e absolverá a pessoa de seus pecados, admitindo a pessoa ao sacramento (2 Co 2.5-11[28]). Neste processo, o pecado, pelo qual a pessoa havia sido excomungada, não será mencionado. – O anuncio de sua reintegração será cuidadosamente lavrado em ata e arquivado, do qual o excomungado receberá uma cópia. 

15. Não impomos, por parte da Igreja, nenhuma penitência. É evidente que a igreja não tem o direito de impor penitências como
era costume na Idade Média, na Igreja Católica (Ap XII). Nem dificultamos seu reingresso. Mas, pode ser que haja questões a serem ordenadas, conforme o caso. Por exemplo, pedir perdão a certas pessoas que foram ofendidas; ou ordenar dívidas individuais pendentes, etc. Quanto às dívidas pendentes deverá reconhecê-las e mostrar boa vontade de assumi-las, prometendo pagá-las o quanto antes possível. Sua participação à Santa Ceia, não deverá depender do pagamento das mesmas. 

16. Chamado para atender um excomungado moribundo. Quando o pastor é chamado para dar a Santa Ceia a um excomungado que está
à morte, ele não deverá recusar o atendimento. Se o excomungado se mostrar arrependido e pedir a absolvição e a Santa Ceia, esta lhe será dada. – No primeiro chamado, o pastor o atenderá e fará uma devoção com ele, que tem por finalidade conduzir ao arrependimento, ouvir sua confissão e consolar a pessoa com o evangelho, a palavra do perdão. Ele poderá dizer ao moribundo, não vim para condenar, mas para dar vida e salvar. Nesta ocasião o moribundo manifestará seu arrependimento e pedirá a Santa Ceia. O pastor, então, marcará uma segunda visita. Dependendo do caso, poderá ser no mesmo dia ou dia posterior. Nesta oportunidade levará consigo duas pessoas da Comunidade (poderão ser membros da diretoria ou outros membros). Fará a pergunta se a pessoa está arrependida, se crê em Cristo, se quer corrigir sua vida, e se está disposto a, se Deus lhe conceder melhoras, encaminhar seu pedido de arrependimento e de filiação à Comunidade, à Assembléia da Comunidade. No caso afirmativo – diante das testemunhas – o absolverá e lhe dará a Santa Ceia. Se vier a falecer, fará seu sepultamento. O caso será relatado, com as testemunhas, a Diretoria e lavrado em ata.
    Se um excomungado falecer sem ter posto em ordem a sua casa, normalmente não se faz o sepultamento. Se familiares que o assistiram em sua doença e seus momentos finais testemunharem que ele clamou por perdão, que oraram com ou por ele, mas não tiveram mais tempo para chamar o pastor (ou isso foi impossível), o pastor fará o enterro.

17.  Excomunhão injusta. Lutero a sofreu. No debate de Leipzig em 1519, o Dr. Eck, dirigiu com astúcia o debate para  levar a discussão
ao tema: A autoridade do Papa em Roma. Lutero respondeu: “O único chefe da Igreja é Jesus Cristo e não o Papa de Roma.” Foi o que o Dr. Eck queria ouvir e bastou para declarar Lutero um herege. Voltou a Roma e pediu que Lutero fosse excomungado. A Bula que ameaçou Lutero de excomunhão inicia assim: “Desperta, Senhor, e julga a tua questão, pois um javali invadiu a tua vinha, um animal selvagem a está devastando.” Lutero respondeu com um panfleto intitulado: Contra a Bula do Anticristo. O que motivou a consumação da excomunhão. Neste panfleto Lutero afirma: “Se o Papa não revogar e condenar esta bula, nem punir o Dr. Eck, então ninguém deve duvidar de que o Papa seja o inimigo de Deus, o perseguidor de Cristo, o destruidor da cristandade e o verdadeiro Anticristo.”
     No dia 06 de março de 1520, o papa assinou com muita pompa a bula de excomunhão de Lutero, que inicia assim: “Leão bispo... servo dos sevos de Deus... para guardar a santa comunhão dos fiéis seguimos o costumo antigo e excomungamos e amaldiçoamos da parte de Deus onipotente, o Pai, Filho e o Espírito Santo, e segundo o poder dos apóstolos S. Pedro e S. Paulo e o nosso próprio poder, amaldiçoamos a todos os hereges –  Cátaros, os Patarinos, os Pobres de Lião, os Arnaldistas, Esporonistas, os Wicliffistas, os Hussitas, os Fraticellos... e Martinho Lutero, há pouco por nos condenado por heresias semelhantes...”  Lutero escreveu a um amigo: “Sinto-me muito mais encorajado, agora que sei que o Papa se revelou publicamente como o Anticristo e a sede de Satanás.”  E no dia 10 de dezembro, Lutero determinou  que fosse afixado no quadro-negro, em Wittenberg, o seguinte anúncio: “Quem estiver impregnado de zelo pelas verdades evangélicas, deverá comparecer, às 9h, na Igreja da Santa Cruz, no lado de fora do muro da cidade, onde serão queimados os livros ateus dos preceitos papistas. Essa será a nossa resposta aos inimigos do Evangelho, que se atreveram a lançar no fogo os livros evangélicos de Lutero.” Quando as chamas estavam altas, Lutero atirou para dentro dela a Bula de Excomunhão, com as seguintes palavras: “Visto que afligiste o santo do Senhor, sejas, pois, consumida pelo fogo eterno.” Aos seus ouvintes advertiu no dia seguinte: “Se vocês não renunciarem de todo o coração ao reino do papa, não poderão ser salvos.”[29]
     Devemos ter o máximo cuidado para não cometer uma excomunhão injusta. Sem dúvida já houve várias. Para os que sofreram uma excomunhão injusta, Lutero escreve: “A excomunhão injusta é o mais nobre dos méritos, devendo, por isso ser suportada com brandura, se não tiver sido dado lugar à tua defesa, humildemente apresentada. Pois aqui podes dizer aquela palavra: Amaldiçoem eles, mas tu, abençoa (Sl 109.28). No caso de uma excomunhão injusta, deves tomar o máximo cuidado para não abandonar a fé. Pois como pertences à comunhão interior da Igreja, a justiça e a verdade não devem ser abandonados por causa da excomunhão exterior... Pois mesmo alguém que morre excomungando injustamente não será condenado por causa disso, a não ser que, por acaso, morresse incontrito e desprezando a excomunhão. A contrição e humildade desliga e reconcilia tudo, mesmo que ele fosse excomungo e jogado na água. Bem-aventurado e abençoado, porém, é quem morreu em excomunhão injusta, pois pela justiça, que não abandou ainda que submetido a tão grande flagelo, será coroado em eternidade,” (Obras. Sel. Vol. I, pág. 197).
     Lutero adverte: “Para ninguém a excomunhão é mais prejudicial e perigosa do que para as pessoas que a impõem, mesmo que seja imposta de modo coreto e unicamente por causa da transgressão, e isto porque elas raramente ou nunca têm tal propósito e, além disso, agem sem temor, não considerando que talvez elas mesmas merecessem cem excomunhões perante Deus, como diz o Evangelho de Mateus 13.33ss. a respeito do servo que devia 10 mil denários,” (Obr. Sel. Vol. II, pág. 243).

18.  Uma palavra especial: Reconciliação e amor. Portanto, sede vos perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste (Mt 5.48). Com estas
palavras Jesus conclui seu ensino sobre o amor ao próximo (Mt 5.43-48).
     A afirmação “vosso Pai celeste” mostra que Jesus está falando aos que, pela fé na graça de Cristo, são filhos de Deus. Somente a fé no amor do Pai que não poupou seu próprio Filho (Rm 8.32), somente a fé na graça de Cristo pode dar forças para perdoar e para amar os inimigos. Somente a fé na graça de Cristo traz o Espírito Santo ao coração (At 2.38) que nos faz reconhecer que nosso Deus é santo e perfeito e que nos dá forças para nos andarmos nos caminhos da lei.
     Nos versículos 23 a 26, Jesus fala da reconciliação: a) pedir perdão; b) perdoar.
a)     Pedir perdão. Se, pois, ao trazeres ao alar a tua oferta, ali te
lembrares... Se tu sabes que teu irmão na fé tem uma queixa de ti, por o teres ofendido, magoado, feito uma injustiça, então não demores. Vai ligeiro e reconcilia-te com ele. Pede perdão. Se lhe causaste algum prejuízo e lhe deves alguma coisa, procura restituir-lhe, conforme tua possibilidades.
b)    Se teu irmão te ofendeu, tenha paciência com suas fraquezas e com
seus erros. Procura com toda a mansidão e amor convencê-lo de seus erros. Se ele te pedir perdão, esteja logo pronto a perdoar de coração.  Pois se terás de comparecer diante de Deus sem ter perdoado, Deus tratará contigo da mesma maneira e te julgará.
     Lembre, nos dois casos: pedir perdão e perdoar, de nada adiantam sacrifícios, orações, ir aos cultos e participar do sacramento do altar. Nada disso é agradável a Deus antes de, o quanto depender de ti, te reconciliares com eu irmão, pedindo desculpas ou perdoando. E de coração, no espírito do teu Pai celestial queremos amar nossos irmãos e, sim, mesmo nossos inimigos, como fomos amados por Deus. Nós o amamos porque ele nos amou primeiro ( 1 Jo 4.19).   

Conclusão – É dever da Comunidade pregar a Lei e Evangelho aos membros e aos de fora. Zelar pela vida santificada de seus membros
por sermões, admoestação e aconselhamento e quando necessário com amor, muita paciência, não precipitadamente, nem com ódio ou outros móvitos escusos aplicar a disciplina eclesiástica em verdadeiro amor fraternal visando conduzir o irmão (ã) que está-se afastando de volta à comunhão na congregação. Estimular e orientar os “sacerdotes reais” no uso do Ofício das Chaves, tanto no aconselhamento aos irmãos, como no abrir as portas do céu aos de fora. Tudo isso deve ser feito pelo apego à Palavra de Deus e muita oração. Lidar com o ser humano é algo difícil, “pois enganoso é o coração humano, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto, quem o conhecerá? (Jr 17.9). Que Deus em sua graça nos conduz neste sublime trabalho de conduzir as pessoas ao céu.
Bem-aventurado os pacificadores,
porque serão chamados  filhos de Deus.


                                                                   São Leopoldo, 15/07/2014
                                                                     Horst R. Kuchenbecker

Literatura a ser considerada

1.     Textos Bíblicos, Bíblia RA: Ex 33.7-11; Mt 18.15-20; 1 Co 5.2-13
2.      Livro de Concórdia. Editora Sinodal, São Leopoldo e Editora Concórdia, Porto Alegre, 1980
- Confissões: Apologia, art. XII  Do Arrependimento; Artigos de Esmalcalde, III, Do arrependimento; Fórmula de Concórdia, Epítome: Das Boas Obras e Terceiro Uso da Lei.
3.      Edward W. A. Koehler. Dogmática: Sumário da Doutrina Cristã, Editora Concórdia, Porto Alegre, RS, 2012. Capítulo IX, 42 Da Igreja.
4.      John T. Mueller. Dogmática Cristã. Editora Concórdia, Porto Alegre, RS e Editora Ulbra, Canoas. 4ª. Edição, 2004. – Doutrinas: Confissão e Absolvição, Terceiro Uso da Lei; Boas Obras.
5.      Escritos de Lutero. Obras Selecionadas: Vol. I, p. 191 – 198: Sermão sobre O Poder da Excomunhão; vol. II, p. 239 – 252: Um sermão sobre a Excomunhão; vol. VII, pág. 303-304.
6.      Catecismo Menor.Editora Concórdia, Porto Alegre, RS, 2013. Exposição Schwan, Ofício das Chaves, pág. 147-155.
7.      C.F.S. Walther, Pastoral Theology, Lutheran News, Inc. New Haven, USA. p. 247 – 254
8.      Norbert H. Mueller e George Kraus. Pastoral Theology. Concordia Publishing House, 1990, USA. P.180 – 184
9.      Armin W. Schuetze e Irvin J. Habeck. The Shepherd under Christ. Northwestern Publishing House Milvaukee, Wisconsin. 1981.USA. p.167 – 175.
10.  E. Eckhardt. Homiletisches Reallexikon. Sucess Printing Co., St. Louis, Mo. (Dois temas: Bann e Kirchenzucht)
11.  Vicente Themundo Lessa. Lutero. Casa Editora Presbiteriana, São Paulo, 1960, pág. 152-154. 
12.  Gustavo Just.  Deus despertou Lutero. Concórdia editora, Porto Alegre, 2003. Pág. 71-74.
13.  M. Nic. Haas. Seelen-Hirte. Editora Fr. Dette`s, St. Louis, MO, 1868, p.396-397.
14.  Church Discipline in the Christian Congregation. A Report of the Commission on Theology and Church Relations of the Lutheran Church – Missouri Synod. November 1985.
15.  Martinho Lutero, Obras Selecionadas, vol. 1, pág. 191ss: Sermão sobre o Poder da Excomunhão.


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Terceiro uso da Lei

     O problema do terceiro uso da lei surgiu no tempo de Lutero. A pergunta era: Deve-se pregar a lei a cristãos renascidos? Alguns teólogos diziam: Não, outros, sim. Os que diziam não, afirmava: Entre cristãos não se devem pregar a lei. Os cristãos devem ser exortados à prática de boas obras pelo evangelho, (Cf.: LC Epítome, Artigo VI; LC pág. 516). Em resposta a esse ensino errado, os Reformadores formularam  a doutrina do Terceiro uso da Lei:

1.     Cremos, ensinamos e confessamos que, conquanto os homens      genuinamente crentes e verdadeiramente convertidos a Deus foram libertados e isentados, por intermédio de Cristo, da maldição e coerção da lei, todavia não estão por isso, sem lei, porém, foram redimidos pelo Filho de Deus, a fim de se exercitarem nela dia e noite. Salmo 119.1. Pois os nossos primeiros pais mesmo antes da queda não viveram sem lei. A lei de Deus lhes foi também inscrita no coração, porque foram criados à imagem de Deus.
2.     Cremos, ensinamos e confessamos que se deve insistir com diligência na pregação da lei não só entre os incrédulos e impenitentes, mas também entre os crentes genuínos, verdadeiramente convertidos, regenerado e justificados pela fé.
3.     Pois, ainda que estão regenerados e renovados no espírito de sua mente, contudo, neste mundo, tal regeneração e renovação não é completa, mas apenas começada. E com o espírito de sua mente os crentes estão em contínua luta contra a carne, isto é, a natureza e qualidade corrupta, que nos adere até a morte. Por causa desse velho homem, que ainda está cravado no intelecto, na vontade e em todos os poderes do homem, é necessário que a lei de Deus constantemente brilhe diante deles, a fim de não acontecer que empreendam, a partir da devoção humana, cultos divinos a seu talante e escolhidos por eles....
4.     Agora, quanto à distinção entre as obras da lei os frutos do Espírito, cremos, ensinamos e confessamos que as obras feitas segundo a lei são e se chamam obras da lei, enquanto arrancadas aos homens apenas mediante o urgir com os castigos e a ameaça da ira de Deus.
5.     Frutos do Espírito, porém, são as obras que o Espírito de Deus, que habita nos crentes, opera através dos regenerados, e que são feitas pelos crentes enquanto renascidos como se não tivessem conhecimento de nenhum preceito, apenas ou recompensa.... (Epítome VI,1-6; LC pág. 517).
 
    O terceiro uso da lei é somente para os justificados que creem em Cristo. O apóstolo Paulo escreve aos cristãos “que eles não estão mais sob a lei, mas sob a graça” (Rm 6.14), e que eles foram redimidos da lei e não estão mais sob a lei (Gl 3.25; 4.5). Mas o mesmo apóstolo diz aos mesmos cristãos? Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor.  Porque toda a lei se cumpre em um só preceito, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo (Gálatas 5.13-14 RA). Nosso Senhor Jesus disse aos seus discípulos a mesma coisa: Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros (João 13.34 RA). Agora, visto que Cristo e seus apóstolos deram aos cristãos o mandamento do amor (a ordem de amarem) que é o resumo da lei. A lei claramente tem um significado e autoridade para nos cristãos. Não no sentido de que os cristãos estejam sob a compulsão da lei, exigências da lei. Pois pela fé eles possuem o perfeito cumprimento da lei de Deus e como frutos da fé sem coerção, mas como servos da justiça seguem a lei. E, uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça (Romanos 6.18 RA).
     Cristãos necessitam da lei por três razões;
1.     Eles precisam da lei como regra de conduta, conforme a qual eles vivem, porque a lei revela as obras que agradam a Deus, e o que Deus requer de seus filhos, pois, se eles seguirem suas próprias inclinações da carne, farão o que desagrada a Deus. [Para não serem enganados por sua carne].
2.     Eles precisam da lei porque a lei lhes mostra e os convence de suas imperfeições em suas obras, isto os guarda da justiça própria, do orgulho farisaico aos quais Deus condena.
3.     Cristãos precisam da lei, pois ela revela que todos os cristãos são imperfeitos nesta vida. O velho Adão nos cristãos com seus desejos e prazeres impede os cristãos a fazerem algo de bom. Por esta razão os cristãos precisam da admoestação e direção da lei, não no sentido de serem nova criatura, pois esta é dirigida pelo Espírito Santo. Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus (Romanos 8.14 RA). [O novo homem não precisa da lei, mas ele se serve da lei para desmascarar e subjugar a carne].
     A respeito deste terceiro usa da lei, Lutero escreve no Sumário dos Dez Mandamentos: “Conforme o espírito, o novo homem, o cristão é justo e sem pecado e não necessita da lei, mas conforme sua carne ele é pecador e tem pecado, por isso um cristão piedoso com um coração puro, que tem uma boa consciência e uma fé não fingida dirá: Ainda que eu tenha um coração puro, uma boa consciência e uma verdadeira fé, eu tenho minha carne, a língua e o punho e estes não são puros. Meu “velho homem” não é puro. Nossa fé cristã que se dirige aos céus ama a lei, assim meu coração tem o desejo e a disposição pela lei, o desejo bom e voluntariamente submisso à lei. Tudo isso é puro e reto. Mas a carne (o velho Adão) não quer seguir, se opõe e deseja tudo o que é ruim, teme a morte e a odeia, quer estar longe de Deus.
     A Escritura, neste ponto, coloca a nós cristãos ao nível de pecadores injustos. Assim o cristão, conforme a carne necessita da lei, para frear e subjugar sua natureza carnal com seus desejos maus. No cristão isto é feito com alegria e voluntariedade, sem dor do espírito. Há uma diferença entre o cristão e o incrédulo. Ambos são freados pela lei, mas com a diferença de que os renovados no espírito, o fazem voluntariamente e com alegria, os outros não. Por isso a lei não condena o cristão, ainda que ele seja um pecador, mas os outros são condenados, porque eles não têm amor à repreensão da lei.” (Reinaldo Pieper).  
     Muito cuidado com a expressão das seitas: “Sou transformado”. Nós preferimos a expressão: “Renasci, sou novo homem.” O que seria isto: Sou transformado? O que foi transformado? Minha carne não foi transformada. Mas no cristão há algo novo e este novo não transforma a carne, mas luta contra a carne e a subjuga. O apóstolo Paulo ao usar a palavra “transformar”, diz: “transformai-vos” (Rm 12.2), indicando a luta diária. Lutero descreve o novo homem ao dizer: Assim a fé é obra divina em nós, que nos transforma e novamente no gera de Deus, e mata o velho homem, torna-nos homens completamente diferentes no coração, ânimo, mente e todas as forças, e traz consigo o Espírito Santo;. Oh! A fé é coisa viva, diligente, ativa, poderosa, de tal sorte que lhe é impossível deixar de operar incessantemente o bem... (Livro de Concórdia (1980, pág. 592).

Nosso Catecismo afirma: Para que serve agora a Lei?
A lei serve para um fim triplo:
a.      Em primeiro lugar, concorre para a manutenção da ordem e da honestidade exterior no mundo, impedindo de certa maneira o desenfreamento grosseiro do pecado. (Freio, uso político).
b.     Segundo lugar, ensina de modo especial aos homens a reconhecerem verdadeiramente os seus pecados. (Espelho, uso pedagógico ou teológico. Nos leva a Cristo.
c.      Em terceiro lugar, mostra ao regenerado quais são verdadeiramente as boas obras. (Norma, uso didático, guia o regenerado).
         A lei é a mesma, mas difere no seu uso e aplicação. O cristão precisa dos três usos.
...................................

Confissão e Absolvição (O terceiro Sacramento)

Confissão:
     Onipotente Deus e misericordioso Pai, eu, pobre e miserável pecador, te confesso todos os meus pecados e iniquidades com que provoquei a tua ira, merecendo mui justamente o teu castigo temporal e eterno.
     Lamento de todo o coração estas minhas culpas e arrependo-me sinceramente.
     Suplico, mediante a tua profunda misericórdia e a santa, inocente e amarga paixão e morte de teu amado Filho Jesus Cristo, que tenhas piedade e misericórdia de mim, pobre pecador. Amém.

Absolvição:
     Em virtude desta vossa confissão, na qualidade de ministro da Palavra, chamado e ordenado, vos anuncio a graça de Deus, a vós que vos arrependeis verdadeiramente de vossos pecados, que credes em Jesus Cristo, e que tendes o sincero e firme propósito de corrigir a vossa vida pecaminosa, pelo auxílio de Deus Espírito Santo, vos anuncio a graça de Deus, e da parte e por ordem de Jesus Cristo, meu Senhor, vos perdoo todos os vossos pecados, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Que pecados devemos confessar? (perg. 332)
     Perante Deus devemos confessar-nos culpados de todos os pecados, também dos que ignoramos, como o fazemos no Pai Nosso. Mas perante o confessor devemos confessar somente os pecados que conhecemos, sentimos, que nos pesam no coração.

Que instrução dá o Doutor Martinho Lutero para o exame próprio antes da confissão? (perg. 337)
     Examina o teu estado à luz dos dez mandamentos: se és pai, mãe, filho, filha, patrão, patroa, empregado: se foste desobediente, infiel, negligente, irado, licencioso,
contencioso, se fizeste mal a alguém com palavras ou ações; se roubaste, descuraste ou cometeste algum dano.
     Obs.: Muito cuidado na absolvição. Mantenha cuidadosamente os três pontos. Por vezes ouço aberrações, como: Deus sabe que somos pecadores fracos, por isso nos perdoa.  Ou: O perdão é para todos. Recebam o perdão de todos os vossos pecados. Ou Perdoa a todos os que creem em Cristo. Ora, os Espíritas também creem em Cristo. Ou alguém acentua a terceira parte. Os que querem corrigir sua vida, mas precisa ser sincero, caso contrário não há perdão. Faz o perdão depender da “condição” d corrigir a vida. O terceiro ponto não é condição, é a expressão da fé: Sim, eu quero sinceramente. Não obrigado pela e exigência da lei, mas por amor a meu Salvador.
                                                                      São Leopoldo, 15/07/21014
                                                                         Horst R. Kuchenbecker





[1] Estatutos da IELB: Cap. II, Art. 9: A exclusão dos membros ocorrerá diante da não observância dos fundamentos doutrinários e das finalidades da IELB. Regimento. Art. 18, VIII: Excluir do ministério ativo da IELB pastores que não preencham os critérios previstos neste Regimento, depois de ouvido o Conselho de Ética, e determinar que suas congregações ou entidades os demitam...- Art. 71 § 6° ...um pastor chamado ou comissionado poderá ser demitido com o voto concorde de dois terço dos votantes presentes à assembléia da congregação, ocorrendo um dos seguintes motivos: ...
[2] Para melhor compreensão desta verdade, precisamos relembrar as tese de Walther sobre Igreja e Ministério. Tese I Da Igreja: A Igreja, no seu sentido próprio do termo, é a congregação (Gemeinde) dos santos, isto é, a totalidade de todos aqueles que foram chamados pelo Espírito Santo, através do Evangelho, para fora da humanidade perdida e condenada; estes são os que realmente crêem em Cristo, sendo, por esta fé, santificados e incorporados em Cristo. – Tese IV: A esta Igreja, de verdadeiros crentes e santos, Cristo entregou as chaves do Reino dos Céus, ela é, por isso, a única detentora e portadora dos bens espirituais, divinos e celestiais, direitos, poderes e ofícios que Cristo conquistou, os quais são encontrados na sua Igreja. – Igreja e Ministério. Tese VI: O Ministério da Pregação é confiado a uma pessoa por Deus, através da Comunidade, a detentora do poder eclesiástico e do Ofício das Chaves, e entregue pelo chamado prescrito por Deus. A ordenação do pastor chamado mediante a imposição das mãos não é uma instituição divina, mas um rito apostólico e da igreja, e somente uma confirmação pública do chamado aceito. Tese VII: O santo Ministério da Pregação é o poder transferido por Deus, através da Comunidade, a portadora do sacerdócio e dos poderes eclesiásticos, para exercer os direitos do sacerdócio espiritual em ofícios públicos por dever comunitário. Tese IX: Ao Ministério da Pregação (Ofício Pastoral) cabe respeito e obediência incondicional quando o pregador maneja a Palavra de Deus, porém, o pregador não tem domínio na Igreja; não tem direito de fazer novas leis, de instituir arbitrariamente os adiáforos e cerimônias,  ou impor e executar sozinho a excomunhão sem o devido consentimento de toda a congregação.  
[3] Disciplina vem de Discípulos. Discípulo é alguém que dá ouvidos ao seu mestre. Quando o discípulo (aluno, seguidor) deixa de dar ouvidos ao seu mestre e guia, ele é disciplinado. Procura-se, com amor, corrigir o aluno e seguidor. Isto é disciplina, uma parte do Ofícios das Chaves.
[4] Pastorale de Walther: Introduzir o procedimento formal da excomunhão numa congregação nova ainda não bem sedimentada, sem dúvida, não está de acordo com o espírito de nossa igreja... Querer que a congregação pratique a disciplina eclesiástica antes de uma cuidadosa instrução sobre a natureza da correta disciplina e o que ela significa, é querer colher frutos antes de semeá-los. (Walther, Pastorale, tese 39ª. Observação 1)
[5] A Série Trienal nos presta um bom auxílio. Sermões devem conter doutrina. Você quer saber como pregar numa época de decadência: Leia os profetas.
[6] Cuidado com a tradução desta passagem da NTLH. Não são sacerdotes do Rei, mas são sacerdotes reais.  Os cristãos foram enxertados em Cristo que é sacerdote e Rei, assim os cristãos são, com Cristo, sacerdotes e reis.
[7] Só uma Comunidade tem o direito de excomungar. Uma sociedade ou organização no mundo pode demitir alguém. Como cristão posso dizer a um pecador: Se você continuar neste pecado(s) você está indo para o inferno, mas isto não é excomungar. Também posso abrir o céu a um pecador arrependido e dizer-lhe: Deus te perdoa os teus pecados por amor a Cristo.
[8] Admoestação. Fale, advirta, corrige. O apóstolo Paulo afirma: “Vós que sois espirituais, corrigi-o, com espírito de brandura, e guarda-te, que não sejas também tentado” (Gl 6.1). O apóstolo Paulo aborda o tema da repreensão de um irmão que caiu em pecado. Ele aborda o tema de forma pastoral. O irmão que errou, o apóstolo considera alguém que foi “surpreendido”, isto é, ele foi objeto da tentação de Satanás que lhe armou ciladas, nas quais ele caiu. Ele foi objeto da tentação. Ninguém gosta de ser repreendido e corrigido. Não trate de simplesmente livrar-se dele. Dar-lhe as costas. Lute, em amor, para corrigi-lo, para livrá-lo da garras de Satanás. Lembre: A Comunidade é uma reunião de pecadores justificados, no qual um ajuda o outro a permanecer no caminho, porque todos vivem do diário perdão de Cristo.
[9] Estas pessoas devem ser pessoas honradas da congregação, pessoas aceitas pelo faltoso.
[10] Toda a congregação aqui são todos os que são responsáveis, diríamos os que foram confirmados e instruídos nas doutrinas. O termo “Igreja” não deve ser limitado, isto é, lembrando que antigamente as mulheres não votavam, hoje elas votas na maioria das congregações. Mesmo assim, há membros que por uma ou outra razão não se inscreveram como votantes. Estes, por serem cristãos, podem também estar na assembléia é falar. Alguns, devido a gravidade de assunto, preferimos que os que sejam maiores de 16 ou 18 anos, irão julgar por seu voto.
[11] Claro que não desejamos que alguém passe para uma outra igreja em cujo meio a Palavra de Deus não está sendo pregada em sua pureza. Mas há situações humanas que tornam, por vezes, a permanência de alguém na Comunidade insuportável. Em cidades onde há mais de uma igreja luterana, normalmente as pessoas passam para a outra Comunidade, caso contrário vão para uma igreja cristã mais próxima de nós. Talvez voltem mais tarde. Numa cidade fiz uma reunião de nossa diretoria com a diretoria da IECLB.  Para minha surpresa constatei que a diretoria da IECLB era quase toda composta de ex membros de nossa congregação. E graças a eles, a comunidade permanecia, na doutrina e prática, muito próxima de nós.  
[12] Confira no final do trabalho o assunto: Terceiro uso da Lei.
[13] O que é um pecador não arrependido? Muitos membros vão responder: Mas esta pessoa é uma pessoa boa. Tem projeção na sociedade. Só porque ele não vem regularmente aos cultos e à santa ceia preciso admoestá-la. Religião é um assunto de fórum íntimo de cada pessoa. Eu não tenha nada de meter o meu bedelho ali. Deveríamos estar contente por esta pessoa ser membro de nossa congregação. Vejam a complexidade desse assunto hoje. 
[14] Muitas vezes as pessoas que eram admoestadas quer pelo pastor, diretoria ou membros pediam desligamento, mas isto começou a gerar problemas. O pedido era levado verbalmente à reunião da diretoria pelo pastor, membro da diretoria ou irmão na fé, lavrado em ato e registrado. Após meses, ou até anos, a pessoa voltava e vinha reclamar, dizendo que isso foi um ato arbitrário do pastor, do membro da diretoria ou de um irmão na fé. Isto nos obrigou a gerar um formulário que era levado à pessoa para que solicitasse sua demissão por escrito. Alguns se negaram a fazê-lo, ficando dependurados ainda por anos no rol dos membros, quando na verdade tinham-se retirado, ou até já participavam em outras congregações.  
[15] Ofendido. Pode ser uma briga entre irmãos, muitas vezes por coisas corriqueiras, que precisa ser sanada. Mas dificilmente chegará à disciplina eclesiástica.
[16] Pecado grave é um pecado contra ou doutrina fundamental ou contra a moral cristã que causa escândalo.
[17] Pecado mortal é um pecado ao lado do qual a fé não pode subsistir. A fé morreu e a pessoa voltou ao estado de “espiritualmente morto”. A pessoa pode se arrepender e voltar à fé. Mas se permanecer impenitente, se permanecer escravizado pelo pecado, ruma para a eterna condenação. 
[18] Se o pecado de um membro é tão manifesto que toda a congregação se escandaliza, então não será necessário seguir os degraus indicados em Mt 18, pois neste caso a congregação é a pessoa da qual Jesus diz: Se teu irmão pecador (contra ti), vai argüi-lo entre ti e ele só (Mt 18.15). Por isso, vemos que, após o apóstolo Pedro ter errado e isto foi um escândalo público, o apóstolo Paulo o admoestou publicamente (Gl 2.13,14). O apóstolo Paulo escreve sobre isso com precisão: Quanto ao que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam (1 Tm 5.20). Nota ao pé da página: Por isso Agostinho escreve: “Se tu sozinho sabes do pecado, então ele pecou somente contra ti. Mas se ele pecou diante de muitos, então ele pecou também contra eles” (Serm. 16, de veris Domini).
[19] Pecado mortal é um pecado ao lado do qual fé não subsiste, além disso, um pecado no qual a pessoa continua vivendo. (1 Co 6.9111; Ef 5.5;Gl 5.21) A pessoa pode se arrepender de um pecado mortal e voltar à graça, mas enquanto ela continua nestes pecados propositadamente, ela está fora da graça, separado de Deus, rumando para a morte eterna.
[20] A exclusão deve ser por unanimidade. Enquanto houver uma voz contra, deve-se ter
paciência. Jesus disse: Diga-o à igreja (Mt 18.11). A congregação são todos os responsáveis, os
confirmados, ou conforme a congregação os maiores de 16 ou 18 anos, não a certas pessoas especiais da Congregação, é um direito de “cada crente, membro da Congregação”. O apóstolo Paulo fala disso em 1 Co 5. Ele se dirige à congregação. “Reunido vós e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor... Expulsai, pois, de entre vós o malfeitor ( 1 Co 5.4,13). Na maioria de nossas congregações, consta em seus Regimentos: ... para a excomunhão de um congregado basta a aprovação de 2/3 dos membros presentes.   (Regimento da IELB, Art. 71   §  6°) Também a Comissão de Teologia da LCMS, em seu parecer: Church Discipline in the Christian Congregation (1985) questiona a unanimidade. Nossos teólogos como Lutero, Walter, Chemnitz, Leyser, Gerhardt, Hesshusius são claros nisso em sua exposição de Mt 18. Confira: Evangeliumharmonie de Chemnitz;  C.F.W. Walther, Pastoral Theology. Lutheran News, INC. New Haven, Missouri, 1995; p. 250; Armin W. Schuetze e Irwin J. Habeck. The Schepherd under Christ. Northwestern Publishing Houe,  Mil. Wisconsin.1981. USA, p. 177.
[21] Pode acontecer que a congregação entregue o assunto a uma comissão para exame. Esta comissão, após examinar o caso, pode dar seu parecer, mas jamais excomungar um membro. Ela não tem o poder para isso. Este poder só cabe à congregação. 
[22] Desconheço as razões pelas quais a Comissão Jurídica da IELB, aprovou diversos regimentos internos de congregações, onde consta que para a exclusão de alguém basta a aprovação de dois terços dos membros presentes na Assembléia. Isto é contra o ensino da Escritura e onde praticado não tem valor. Pois a Regimento não é a Bíblia, e cada regimento afirma nos seus primeiros parágrafos que a Comunidade se regerá pela Bíblia, conforme exposta nas Confissões do Livro Concórdia de 1580.  
[23] Por exemplo: Se alguém nega a SS Trindade, ele deixa de ser cristão; mas o fato de negar, digamos, os sacramentos, pode continuar ser um cristão, como católicos e pessoas das seitas evangélicas.
[24] A readmissão na Comunidade também é um processo difícil que requer compreensão, amor e paciência. Jesus já foi criticado pelos fariseus que diziam: Este recebe pecadores e come com eles (Lc 15.2). Será que em nossas congregações não há mais alegria por um pecador que se arrepende? (Lc 15.7) Jesus recebeu a mulher adúltera (Jo 8.3), o malfeitor na cruz (L 23.42). Deus recebeu o rei Manassés (2 Cr 33.13).
[25] Quando um excomungando vem à Comunidade e pede perdão, precisamos lembrar o Evangelho, no qual Jesus diz: “Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora (Jo 6.37). O que vem a mim! Não importa quão imundo e manchado de pecados, não importa quão fundo caiu e quão difamado seja, Jesus não impõe nenhuma condição. Ele diz diretamente: O que vem a mim! o que se refugia em mim, busca em mim graça e perdão, eu não o lançarei fora. Vinde a mim todos os que estais cansados e sobre carregados e eu vos aliviarei (Mt 11.23). Neste espírito a Comunidade deve agir.
[26] Temos o caso do Saulo (Paulo). Quando ele se converteu e veio aos apóstolos em Jerusalém, eles  desconfiaram das intenções de  Saulo e não o receberam como irmão. Barnabé teve que intermediar (At 9.26,27).
[27] Toda a aceitação de uma pessoa passa pela Assembléia da Comunidade, que alguém venha com transferência, por profissão de fé ou neste caso pedindo sua readmissão. Em todos os casos aceitamos sua confissão de fé. O quanto essa confissão é verdadeira não podemos questionar. Isto sua vida mostrará. Em caso de viciados, sabemos que eles recaem muitas vezes. Eles permanecem em tratamento, com direito à Sant Ceia.
[28] A readmissão de um congregado penitente. Vejamos alguns casos. Uma pessoa importante no Coral da Comunidade foi imprudente e disse algo que ofendeu seus irmãos. O ensaio terminou sem que ele pedisse desculpas. Alguns ameaçaram se retirar do coral, caso ele não pedisse desculpas. No próximo ensaio esta pessoa não compareceu. Como era pessoa chave e muitas coisas no coral dependiam dele, sentiram que isso seria o final do coral...
      O Diretor de uma firma foi leviano na administração. A firma enfrentou problemas. Ele teve que demitir muitos empregados, seus irmãos na congregação. Isto gerou um mal estar na Comunidade: Como pode um cristão proceder assim? ...
     Um pastor tratou de um caso difícil com uma família de sua Comunidade. Seu julgamento estava correto, mas ele foi imprudente no seu falar. A família se ofendeu e se afastou da Comunidade, deixando um rasto de insatisfação. O pastor caiu na antipatia de muitos membros. – Deveriam lembrar que todos nós somos humanos, sujeitos a erros.
     O apóstolo Paulo aborda nesta passagem citada casos assim. Na Comunidade de Corinto havia um irmão que foi surpreendido numa falta. Foi repreendido. Parece que não aceitou a repreensão. O apóstolo foi duro com ele e recomendou a repreensão pela maioria. Ele foi excluído da Comunidade. Depois ele se arrependeu e pediu ser readmitido. Mas o escândalo foi grande. A imagem da Comunidade sofreu ante a opinião pública. Eles não o queriam aceitá-lo logo, sem mais nem menos. O apóstolo admoesta a Comunidade pastoralmente para que perdoem e aceitem a pessoa. Não faz bem a uma Comunidade quando problemas de desentendimento, de disciplina se estendem por muito tempo. É preciso agir e resolver os problemas. A Comunidade vive do perdão diário de Cristo. Cristo nos deu exemplo nisso.   
[29] Vicente Themundo Lessa. Lutero. Casa Editora Presbiteriana, São Paulo, 1960, pág. 152-154.  Gustavo Just, Deus despertou Lutero. Concórdia editora, Porto Alegre, 2003. Pág. 71-74.