quarta-feira, 27 de julho de 2016

500 Anos da Reforma - XII

XII  - Claus Harms e suas 95 teses
     Ao falarmos das 95 teses de Lutero e suas conseqüências, não podemos deixar de mencionar Claus Harms e a publicação de suas 95 teses contra o racionalismo. Ele as escreveu influenciado pelas teses de Lutero.
     Claus Harms nasceu em 25 de maio de 1778, em Fahrstaedt, Schleswig-Holstein e faleceu em fevereiro de 1855 em Kiel, Schleswig-Holstein, Alemanha.
         Seu pai foi dono de um moinho. Seu filho Claus se criou no moinho e aprendeu a profissão. Quando seu pai faleceu em 1796, seu irmão e ele administraram o moinho. Aspirando outro trabalho, venderam o mesmo. Claus fez os cálculos e viu que com a herança poderia estudar na Universidade de Kiel, onde foi estudar teologia. Ele se dedicou com fervor ao estudo. Era a época em que florescia na Europa o racionalismo. Ao ler o livro de Friedrich Schleiermacher: “Uma palavra sobre religião aos intelectuais”, ele ficou impressionado. O livro deu-lhe um forte impulso ao cristianismo. Após os estudos, ele foi professor particular. Depois atuou como diácono na catedral em Kiel. Em sua auto-biografia ele escreve: “De repente eu reconheci toda a nulidade do racionalismo, do autoconhecimento e das boas obras. Reconheci a necessidade de que a salvação deve vir de outra fonte”. Ele chamou esta hora de “seu nascimento e morte de seu “velho homem” e procurou orientação para sua vida nos sermões de Schleiermacher.  Constatou, então, que aquele que o despertara para a religião, não tinha o pão da vida. Voltou-se ao estudo das 95 teses de Lutero e sermões do mesmo. Tornou-se um vigoroso pregador do evangelho. Em 1816, foi promovido a diácono principal na Igreja São Nicolau em Kiel.
     Na época, os reis da Dinamarca, aparentados com a nobreza de Schleswig-Holstein, oprimiam e exploravam o povo. No domingo de septuaginta, Harms fez uma vigorosa pregação contra essa exploração e convocou o povo à “guerra e, após a guerra, ao combate do inimigo interno, a corrupção e exploração”. O sermão obteve grande repercussão. Ao mesmo tempo, as autoridades o repreenderam. Ele não se deixou intimidar, provou os fatos e continuou a luta. Iniciou também sua luta contra o racionalismo e o unionismo entre luteranos e reformados. Para o 3º Centenário da Reforma luterana, em 1817, ele publicou as 95 teses de Lutero e também suas próprias 95 teses, nas quais se volta contra a incredulidade do seu tempo, chamando de volta às Confissões luteranas.
     Vejamos, de forma resumida, algumas dessas suas teses:
1ª tese. “Se nosso Senhor e Mestre, Jesus Cristo, diz: “Arrependei-vos...” ele quer que as pessoas se deixem moldar pelos ensinos  da palavra de Deus e não moldem os ensinos de Deus conforme seus desejos.”  
3ª tese. “A idéia de uma reforma progressiva, tal como conhecida hoje, reformula o cristianismo em paganismo e o mesmo para fora do mundo. “
11ª tese. “A consciência não pode perdoar pecados. Em outras palavras: Ninguém pode perdoar-se os pecados a si mesmo (como a psicologia de nossos dias o sugere, novamente). Somente Deus pode perdoar pecados”. 
21ª tese. “No século dezesseis o perdão custava dinheiro, no século dezessete ele é gratuito e cada um serve-se do mesmo como quer”.
24ª tese. Num hino popular lemos: “Meu amigo hoje tens a escolha: Vida ou morte, qual vais aceitar... ´; em nossos dias, parece que o ser humano matou o diabo e fechou o interno. [Hino: Ao findar o labor desta vida...]
27ª tese. “Conforme a fé antiga, Deus criou o homem; conforme a nova fé, o homem criou Deus” (Is 44.12-20). 
32ª tese. “A atual religião racional é ou razão ou religião, ou despida de ambas”.
54ª a 62ª teses. Estas teses dirigem se contra a tradução da Bíblia chamada Altonaer, feita em 1815 por Nikolaus Funk, com anotações e interpretações racionalistas. Harms pediu à Soc. Bíblia uma nova edição revisada de Lutero.
75ª tese. “A Igreja luterana, como uma pobre criada, quer-se enriquecer pelo casamento (com o racionalismo). Cuidado, não realizem este casamento na sepultura de Lutero, seus ossos podem reviver.
92ª tese. “A Igreja evangélica católica é uma igreja maravilhosa. Ela se atém e cresce especialmente pelo apegar-se aos sacramentos”.
93ª tese. “A Igreja evangélica reformada é uma igreja maravilhosa. Ela se apega e se forma pelo apego à Palavra”.
94ª tese. “Mais maravilhosa do que ambas é a Igreja evangélica luterana. Ela se apega e é formada pelo apego à Palavra e aos sacramentos”.
95ª tese. “Por Palavra e sacramentos, sem a cooperação humana, a fé e a Igreja são geradas, mas o caminho dos ímpios perecerá”. (Sl 1.6) 
     As teses geraram acirradas discussões. Surgiram mais de 200 escritos, pró e contra. O próprio Harms editou diversos folhetos e estudos para uma compreensão mais detalhada. Especialmente sua carta dirigida ao Dr. Schleiermacher, de 1818. 
     Ele sabia, sem apelar ao sentimentalismo, atrair a atenção de seus ouvintes. Ele escreveu: “Não sei tocar a harpa como Davi, mas sei manejar bem a funda”. Sua influência sobre a cristandade do seu tempo foi grande.
    Ele publicou vários livros. Além dos citados: - Pregações Cristológicas, 1821. - Postila de sermões de inverno e verão, 1825. - Da Salvação, 1830. - Da Santificação, 1833. – Da Criação, 1834. – O Pai Nosso, 1840. – Pregação sobre a Bíblia, 1840. – Apocalipse, 1844. – A Confissão de Augsburgo, comentada, 1847. – Consolo, 1852. – A fé cristã, 1864. – Teologia Pastoral, 1833. – Não me consta termos algo disto em português.
    Ele era de uma personalidade marcante e cheia de humor. Era respeitado também por seus adversários. Muitas vezes chamado de “Pai” da igreja de Schleswig-Holstein.
     Fontes: http://wikisource.org/wiki/ADB:Harms=Claus. – Lutheran Cyclopedia, St. Louis, 1954


XIII – Bênçãos da Reforma

     Transcrevemos aqui as sugestões de nosso estimado professor do Seminário Concórdia de Porto Alegre, Dr. Mário Rehfeldt, sobre as bênçãos da Reforma, elaboradas para o 450° Aniversário da Reforma, em 1967.

I – A Bíblia nas mãos do povo – Examinai as Escrituras... (João 5.39). A Reforma tornou possível a todos os cristãos que podem cumprir esta ordem de Cristo.

1.1  - Situação anterior
     Com o correr dos séculos, a Bíblia deixou de ser livro do povo para ser apenas livro da hierarquia.
     Em geral só era encontrada em latim. As traduções para as línguas populares eram poucas, malfeitas, pouco inteligíveis, volumes seus eram quase inexistentes. Além disso, a tradução era desencorajada, e, às vezes até proibida: caso dos valdenses, no norte da Itália, dos seguidores de Wiclif, na Inglaterra, de Tindale que foi morto por traduzir para o inglês e publicá-la.
     Não era livro do povo: era considerado um livro obscuro – foi tornado um livro obscuro: pelas interpretações contraditórias dos mestres – interpretações alegóricas que muitas vezes pouco se importavam com o texto real, perdendo-se em fantasias. Era tornado livro obscuro: por ter sido subordinado à filosofia aristotélica pelos escolásticos. O papado se arrogava o direito de decidir o sentido verdadeiro. Mas o papado da época, os papas das famílias Bórgia e Médici, mundanos, pouco interesse tinham por religião e muito menos em instruir o povo na Bíblia.
     O sentido claro e simples da Escritura era obscurecido também por outras fontes de autoridade que eram colocadas ao seu lado, ou até acima dela: os decretos dos concílios, as opiniões dos pais eclesiásticos e os pronunciamentos dos papas.
     Tal era a situação quando Lutero tornou-se doutor em Teologia Bíblica e jurou prestar fidelidade total à Escritura por toda a vida. Partindo de sua própria experiência de ter encontrado o Deus misericordioso no seu estudo particular da Escritura, desejou que outros também o encontrassem desse modo.

1.2  - Sola Scriptura
     Já em 31 de outubro de 1517, Lutero inicia a primeira de suas 95 teses com as palavras: “Quando nosso Senhor Jesus Cristo diz... “, isto é, fundamenta o que escreve e baseia sua teologia apenas nas palavras de Cristo e estas só encontramos na Bíblia.
     Aos poucos, estudando a história da igreja, descobriu que Papas e Concílios são falíveis e até se contradizem uns aos outros. Chega a perceber isso com clareza no Debate de Leipzig em 1519, quando pela primeira vez repudia a autoridade final, decisiva, dos concílios ao lado da Escritura. A partir dessa data, reconhece somente uma autoridade final na igreja em questões de fé e vida: A Escritura Sagrada.

1.3  - Tradução
Para que o povo pudesse descobrir que a Bíblia não é um livro obscuro, que Deus de fato pode ser encontrado nela, como um Deus misericordioso, e que pelo estudo particular também os leigos podem encontrá-lo, Lutero iniciou sua tradução para a língua do povo. Em 1517 traduziu os sete salmos penitenciais. Entre 1518 e 1522 traduziu onze partes diferentes. De dezembro de 1521 a fevereiro de 1522, em apenas onze semanas, realizou a extraordinária tarefa de traduzir todo o Novo Testamento para a língua popular, em linguagem que o povo de fato entendia. A primeira edição do Novo Testamento saiu em setembro de 1522. Em dois meses foram vendidos 5.000 exemplares. Preço: R$ 30,00 a 50,00. Com colaboradores traduziu também o Antigo Testamento, publicado completo em 1534. Até o fim da vida aperfeiçoou a tradução. No último dia de sua vida ainda corrigiu provas da impressão da última revisão, foram as últimas páginas impressas sobre que seus olhos repousaram.
     Em 12 anos, entre 1522 a 1534, foram publicadas 106 edições do Novo Testamento, mais de 200.000 exemplares. O povo teve sua tradução da Bíblia. Esta tradução deu ao povo alemão uma língua comum que todos adotaram. Quando o povo leu na própria língua a Bíblia, a nação foi transformada, ou melhor criada por esta leitura. 

1.4  - Hoje
     A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB) seguindo esse exemplo, colaborou e ainda colabora ativamente na revisão da Bíblia na língua nacional e colabora com a Sociedade Bíblica na tarefa de dar a Bíblia à pátria.[1]
     Esta bênção da Reforma: A Bíblia nas mãos do povo, com o correr dos séculos se estendeu a todas as denominações cristãs. Hoje também a Igreja Católica Romana incentiva o estudo da Escritura pelos leigos, e até mesmo, após combater as Sociedades Bíblicas no século passado, em nossos dias entrou em contato com elas para uma maior propagação das Escrituras. 
     A Reforma Luterana surgiu do estudo da Escritura. A Bíblia era estudada em horas de estudo bíblico nas igrejas, em estudos diários nas casas; nas devoções domésticas e leitura particular.
     Denominam-nos heréticos da Reforma por termos introduzido o estudo bíblico nas igrejas, devoções domésticas e estudo privado.

II - Catecismo
     Lutero tinha confiança nos jovens. Quanto ao progresso e ao futuro da igreja, ele manifestou maior esperança na geração jovem do que na geração adulta de sua época. Para que essa esperança pudesse ser concretizar, batalhou, incansavelmente, pela educação cristã esmerada de crianças e jovens.

2.1Situação
      Quando Lutero começou a pregar, a ignorância religiosa era lastimável: religião só exterior: culto de relíquias, a santos, rosários, peregrinações e superstições. Além disso, predominava a religião de obras. Era opinião generalizada que bastava crer o que a igreja crê, sem saber o que é que ela crê.

2.2 – Conteúdo
     Para que cristãos pudessem prestar culto consciente a Deus, Lutero pregou repetidamente sobre os fundamentos da fé cristã. Pregou sobre lei e evangelho.
     Lei: pregou sobre os Dez Mandamentos, demonstrando suas exigências reais, recusando-se a fazer interpretação diluída deles, comum na época, para tornar mais fácil seu cumprimento. Interpretou os Dez Mandamentos com todo o rigor que Cristo usou no Sermão do Monte, para que a verdadeira finalidade da lei ficasse evidente: que é impossível a qualquer ser humano cumprir integralmente as exigências de Deus. Destacou que a finalidade primordial da pregação da lei é mostrar ao homem sua condição de pecador, de transgressor de todos os mandamentos, a fim de que se arrependa dos seus peados e busque auxílio com Deus.
     Evangelho: Expôs o Credo.  1° Artigo: Deus nos criou e não nos abandonou no pecado. 2° Artigo. A explicação de Lutero do Segundo Artigo e uma das mais balas explicações do evangelho. Cristo pagou ao Pai pelos pedados de toda a humanidade e reconciliou com Deus. 3° Artigo. Deus oferece esta reconciliação à humanidade pelos meios da graça, Palavra e sacramentos, para que todo o que crê em Cristo tenha perdão, vida e eterna salvação. Pelos meios da graça o Espírito Santo opera arrependimento e fé. Nossas obras, que seguem imediatamente à fé, são a manifestação visível da fé, são os frutos da fé.  Pela fé, nós nos relacionamos de forma vertical com Deus; pelo amor, nós nos relacionamos com o próximo.  
     Batismo.  No batismo, Lutero salienta a atividade do Espírito Santo. Através da água unida à palavra, o Espírito Santo cria, gera a fé. Lutero aceitou batismo de crianças, pois o batismo é o único meio da graça, para trazer também às crianças os benefícios de Cristo. Conforme a pregação de Lutero, o batismo não é só o sacramento de ingresso na igreja, pelo seu incentivo à recordação diária do batismo, faz dele uma fonte de energia espiritual constante.
     Santa Ceia. Como última parte fundamental das verdades cristãs, Lutero tratou da Ceia do Senhor. Divergiu de romanistas, ao rejeitar a teoria da transubstanciação, o sacrifício da missa, a Santa Ceia sob uma espécie e a adoração da hóstia. Divergiu dos reformados, rejeitando a interpretação simbólica das palavras da instituição, isto é, de que pão e vinho são somente símbolos do corpo e sangue de Cristo. Reafirmou a presença real (de ser verdadeiro corpo e sangue – não somente uma presença espiritual) de Cristo na Santa Ceia, o benefício real que Cristo confere por ela, a saber, o perdão dos pecados e fortalecimento da para a luta contra o pecado. 
     Este é o conteúdo essencial das várias séries de sermões que Lutero proferiu desde 1516. Lutero não se contentou em somente pregar e instruir o povo em Wittenberg onde residia, ele fez de tudo para difundir este precioso evangelho em sua pátria e arredores.

2.3 – Histórico e Significado
     Em 1529, depois de visitar várias congregações e ver com os próprios olhos a ignorância religiosa reinante e seus funestos resultados, escreveu e publicou o Catecismo Maior e o Catecismo Menor, para colocá-los nas mãos de todos os pastores e professores, e este por sua vez, nas mãos dos pais e das crianças. Seu Catecismo Menor tornou-se um dos manuais de instrução religiosa mais popular da história do cristianismo. Em pouco tempo, devido ao estudo do mesmo, os leigos conheciam mais dos fundamentos do cristianismo que antes muitos sacerdotes. Quanto à importância do Catecismo para a instrução das crianças basta citar as palavras do renomado historiador Roland Bainton: “Pode-se atribuir, sem exagero algum, à Reforma a criação do primeiro corpo de literatura religiosa para jovens”. A própria Igreja Romana, no Concílio de Trento (1545 – 156), nas sessões 24 e 25, teve de tomar medidas para publicar também um Catecismo para poder da mesma forma instruir melhor seus membros. (Sessão 24 cp. VII; Sessão 25, cp. XXI)
     Lutero desejava que o Catecismo fosse usado na igreja como base para sermões e especialmente no lar. O pai deveria examinar os filhos pelo menos uma vez por semana, quanto à memorização do mesmo. Ele mesmo dava o exemplo, ensinando seus filhos em casa. A alta estima que o Catecismo tinha se depreende das próprias palavras de Lutero: “Não pense que o Catecismo é coisa de somenos importância, que pode ser lido às pressas e colocado de lado. Mesmo sendo eu um doutor (em teologia), tenho de agir assim como uma criança e dizer palavra por palavra todas as manhãs e sempre que posso a Oração do Senhor, e os Dez Mandamentos, o Credo e os Salmos... Ocupar-se com a palavra de Deus auxilia contra o mundo, a carne e o diabo e todos os maus pensamentos”.
     Quanto a seu uso nas escolas é interessante notar que ainda no século XVII em muitos lugares, no interior da Alemanha, era o único livro didático. O Catecismo Menor servia para aulas de religião, de linguagem (ditado, leitura, cópia) e – no fim do Catecismo se achava a tabuada, servindo assim até para a aritmética.
     A educação cristã da juventude foi um dos pontos básicos da Reforma. Pais e educadores que desejam ser herdeiros da Reforma farão bem em por em prática a séria exortação que Lutero lhes faz no prefácio do Catecismo Menor: “Particularmente também aponta (o pastor que ensina o Catecismo) aos magistrados e pais o seu dever, para que governem bem e enviem seus filhos à escola, indicando-lhes como devem fazê-lo e onde não o fazem, quão maldito pecado estão cometendo. Desta maneira derrubam e devastam tanto o reino de Deus como dos homens. E mostra-lhes claramente, quão grande mal cometem, onde não ajudam educar filhos para pastores, pregadores, funcionários, etc., e que Deus há de castigá-lo terrivelmente por este motivo”.
     Aos pastores admoesta: “Por isso rogo a vós todos por amor de Deus, meus senhores e irmãos, que são pastores e pregadores, encarregai-vos a que vos devoteis a vosso ofício e apiedai-vos do povo confiado a vós, e que nos ajudeis e incutir o Catecismo na gente, especialmente na mocidade”.

III – O Hinário
     O povo de Deus sempre expressou sua devoção, seu arrependimento, sua fé, sua esperança pelo canto no culto divino. Já no Antigo Testamento o povo de Deus cantava. O próprio rei Davi, para embelezar o culto público, construiu instrumentos musicais, compondo salmos e criando um corpo de 4.000 cantores. (1 Cr 23.5; 25.1,6) Jesus e os apóstolo também cantavam. (Mc 14.25) Na era pós-apostólica a congregação cantava no culto como a carta de Plínio a Trajano em 112 AD o comprova: “Num dia determinado reúnem-se antes de raiar do sol e cantam responsivamente hinos a Cristo como Deus... “

 3.1 – Congregação Passiva
     A congregação, que na igreja antiga participava ativamente no culto, com o correr dos séculos foi ficando mera espectadora passiva, enquanto os sacerdotes monopolizavam o serviço religioso. Aos leigos só restava a participação em raros responsórios, o restante era realizado pelo sacerdote e pelo coro, de meninos ou de monges.
     O culto era em latim que a grande massa do povo não entendia.

3.2  - Reforma Conservadora do Culto
Tornar o culto inteligível, e, portanto, mais proveitoso, e fazer a congregação
participar ativa e conscientemente do culto, foi uma das realizações mais notáveis da Reforma Luterana, que em nossos dias está sendo adotada inclusive pelos seus adversários de então.
     Cedo Lutero percebeu que sua pregação evangélica não deixaria de afetar a liturgia romana. Procurou reformar o culto sem destruir o que havia de belo e bom no mesmo. Seu princípio fundamental nesta reforma foi: colocar o evangelho no centro do culto, deixar o culto tradicional inalterado, tudo o que não contradizia, deturpava ou obscurecia o evangelho da salvação gratuita adquirida pela fé nos méritos de Cristo era conservado. Só retirou do culto aquilo que prejudicava a compreensão do evangelho. Deu importância maior ao sermão.    
     Para o povo compreender o culto, traduziu a liturgia para a língua do país (o alemão), auxiliado por músicos, adaptou a música gregoriana, com excelente resultado.
     Para o povo tomar parte ativa no culto, ele fez a congregação cantar as partes da liturgia a qual antes só ouvia o coro cantar. Para aumentar a participação popular reintroduziu o canto congregacional que quase tinha desaparecido na Idade Média. Roland Bainton escreve: “Lutero desenvolveu tanto esse elemento que pode ser considerado o pai do canto congregacional”. É digno de nota que Lutero encorajou a música e músicos para que o evangelho também fosse propagado pelo canto. Isto numa época em que Zwínglio e seus adeptos se posicionaram contra a música. O organista de Zürich chorou amargamente quando os fanáticos, impulsionados por Zwínglio, destruíram seu órgão. “O organista de Berna perdeu tanto seu órgão como seu lar, porque os novos protestantes viam na música apenas a vaidade papal”. (E. G. Schwiebert)

3.3  – Amor à Música
Lutero não escondeu seu entusiasmo pela música. Ouçamo-lo: “Aquele que
despreza a música, como o fazem todos os fanáticos, não me agrada. Pois a música é um dom de Deus, não um dom dos homens. A música afasta o diabo e torna as pessoas felizes; ela nos induz a esquecer toda ira, impureza, arrogância e outros vícios. Depois da teologia, atribuo à música o lugar mais elevado e a maior honra”.

3.4  Hinário Popular  
     Ao iniciar a tarefa de dar hinos de língua alemã ao povo, Lutero só conhecia três antigos hinos religiosos populares nessa línguagem, um de Natal, outro de Pentecostes e um para a Santa Ceia. Onde encontrar músicos e poetas para ajudá-lo?
     Incentivou os amigos que possuíam belo estilo em alemão e veia poética, mas em meio ano conseguiu deles só seis hinos. Assim assumiu também a tarefa de escrever as letras para melodias de hinos latinos já existentes e até mesmo compor melodias novas. Em 1523 e 1524 compôs vinte e quadro hinos. No restante de sua vida só mais doze entre os quais o imortal Castelo forte é nosso Deus.
     Em 1524 foram publicados vários hinários, o mais importante deles, que foi editado por Joh. Wather, um livro de corais de 4 ou 5 vozes, com 32 hinos, vinte e quatro dos quais da autoridade de Lutero. A linguagem deles era popular, simples e artísticos. O conteúdo transmitia os sentimentos da alma cristã em seus momentos de aflição, tentação e alegria, ou apresentava o evangelho como pregação cantada da misericórdia divina. Seu conteúdo profundo foi e é inspiração constante até no preparo de sermões.
     Os hinos de Lutero se espalharam pela Alemanha e seu hinário foi reimpresso em toda parte. Durante sua vida já tinham aparecido quarenta e sete coletâneas de hinos. No fim até a Igreja Romana copiou sua renovação do canto congregacional e inclusive os zwinglianos e calvinistas começaram a cantar na Igreja.
     As comunidades luteranas aprenderam a cantar. Havia horas de ensaio durante a semana para toda a congregação, e em cassa o canto era recomendado para depois da instrução catequética. Por vezes, Lutero se queixava de que sua gente tinha preguiça de aprender a cantar, mas seus adversários dão testemunho do contrário. Um jesuíta testificou “que os hinos de Lutero mataram mais almas do que seus sermões”. 
     Uma crônica da cidade de Magdeburg nos mostra como seus hinos eram propagados “No dia de S. João, entre Páscoa e Pentecostes, um homem velho, um tecelão, veio pelo portão da cidade para o monumento do imperador Otto e ali ofereceu hinos para vender, enquanto os cantava para o povo. O burgomestre, voltando da missa matutina e vendo a multidão, indagou de um dos criados o que acontecia. “Há um velhote ali adiante”, respondeu, “que está cantando e vendendo hinos do herege Lutero”. O burgomestre o prendeu e lançou na prisão; mas duzentos cidadãos intercederam e ele foi libertado”. Um dos hinos que ele cantava eram “Das profundezas clamo, ó Deus”.
      O Hinário é uma das mais preciosas heranças da Reforma. Por ter ensinado aos cristãos todos a cantar a glória e a misericórdia de Deus. Através do canto congregacional, a Igreja Luterana merece o nome que recebeu na época da Reforma: “A Igreja que canta”.

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XIII – Rosa de Lutero

R o s a   de   L u t e r o


Introdução

    Além dos livros e tratados que Lutero escreveu, ele queria - o que era muito comum na época – resumir sua doutrina num símbolo, num selo ou brasão. Falou disso a seus amigos. Eles ajudaram a pensar. Finalmente conseguiu resumir seus pensamentos e pediu a um amigo que elaborasse o selo, a chamada Rosa de Lutero.
     O próprio Lutero supervisionou a criação do mesmo, no ano de 1519.
    Não temos muitos dados históricos a respeito, exceto a carta que Lutero escreveu, no dia 08 de julho de 1530, a seu amigo Lazarus Spengler de Nürnberg. Lutero se encontrava em Coburg, onde permaneceu seis meses, enquanto os príncipes e alguns teólogos (pastores) se apresentaram em Augsburgo, na Dieta do Imperador (Dieta uma Assembléia política), onde foi lida a Confissão de Augsburgo.
      Na carta que ele escreveu a seu amigo Lazarus Spengler, Lutero explica o conteúdo do selo. É o resumo de sua fé, da fé cristã de todos os tempos.

- A cruz preta lembra a mensagem do amor de Deus em Cristo, que na cruz derramou seu    
        sangue para reconciliar a humanidade com Deus. (João 3.16)
- O coração vermelho. Com o coração se crê para a justiça. (Romanos 10.10)
- A rosa branca. O coração está numa rosa branca, pois o justo vive pela fé (Romanos 1.17),  
        que lhe confere santidade, alegria e paz.
- O fundo azul-celeste simboliza a alegria no Espírito e fé, que é o começo da alegria celestial
        futura, na eternidade.
- O círculo dourado. A bênção celestial, a salvação é eterna.
     Segue a carta de Lutero a seu amigo Lazarus Spengle
     Graça e paz do Senhor. Visto que desejas saber se meu escudo ou brasão que você esboçou e me devolveu, realmente reúne meus pensamentos, quero te notificar as razões originais para tal símbolo. Eu quero enfocar neste símbolo a minha teologia.  
     Primeiro, ali deve estar uma cruz preta dentro de um coração. O coração deve ter sua cor natural. Nisto eu relembro a mim mesmo que a fé no crucificado nos salva. Porque com o coração se crê para justiça. (Rm 10.10)
    Embora a cruz seja preta, que mortifica e também causa dor, ela nunca permite que o coração perca sua cor, não destrói sua disposição natural, isto é, a cruz não mata, pelo contrário, mantém a vida. “O justo viverá por fé”. (Rm 1.17)
    Tal coração, no entanto, é colocado numa rosa branca, para indicar que a fé confere alegria, conforto e paz; não como o mundo o dá, e é colocado numa rosa branca alegre (Jo 14.27). Por isso a rosa precisa ser branca e não vermelha, pois branco é a cor do Espírito Santo e de todos os anjos. (Mt 28.3; Jo 20.12)
     Tal rosa deve ser colocada sob um campo celestial (azul), visto que este tipo de alegria no Espírito e fé é o começo da alegria celestial futura. Certamente já a temos apegado em esperança, mas ainda não revelado.
     Em torno deste campo, um anel de ouro, porque a salvação no céu perdura para sempre e nunca tem fim. Como o ouro é o mais nobre e melhor metal, assim a salvação é preciosa e além de tudo alegria e bênção.
    Em boa amizade eu digo isto a ti. Isto é um compendio da minha teologia. Que possa redundar em meu crédito. Cristo, nosso querido Senhor, esteja com teu espírito e tua vida. Amém. Da selva de Coburg, 8 de julho de 1530.
Conclusão
     Essa explicação aparece em uma carta de Lutero enviada a Lazarus Spengler, datada de 8 de julho de 1530. Ela aparece em diversas fontes, como na Edição Weimar das Obras de Lutero (Briefe, vol. 5: 444f) e na edição inglesa das obras de Lutero (Luther's Works: American Edition, vol. 49:356-359).
    O selo de Lutero é seu compêndio de teologia. É o selo do amor de Deus, que o próprio Cristo imprimiu no coração de Lutero. Não é de admirar que Lutero designou o selo como seu escudo. Embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno. (Ef 6.16)
     Lutero sabia-se abraçado, armado e bem protegido em Cristo. Baseado neste seu conceito, o selo de Lutero está à disposição de todos os fiéis, e não é simplesmente a história privada de Lutero. Este selo tem servido ao luteranismo.

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Mensagem sobre o Selo de Lutero

Para introdução, escolha um fato do dia ou da vida de Lutero.
1 – A Cruz Preta dentro de um coração com sua cor natural, o vermelho. – Este é o centro, uma dualidade original: cruz e coração.
      A cruz veio para a vida humana. A vida humana só encontra verdadeira vida na cruz, na qual há vida e salvação.
     Esta união, no entanto, só ocorre pela fé no crucificado, porque a fé se apega ao crucificado, a Cristo e sua obra. Pela fé Cristo vem ao coração para fazer ali habitação. A fé vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo. (Rm 10.17)   
Porque com o coração se crê para justiça, e com a boca se confessa a respeito da salvação. (Rm 10.10)
     Embora a cruz seja preta, um instrumento de morte, visto que Cristo nela padeceu, ela se tornou um instrumento para a vida. Um paradoxo: morte e vida. Pois a Escritura afirma: Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro. (Gl 3.10)
    Sem cruz, a coração segue sua inclinação natural, seu egoísmo, mesmo em sua religiosidade, buscando sua salvação em ídolos e por obras. Estando vos mortos em vossos delitos e pecados... sendo filhos da ira como os demais... (ele) nos deu vida juntamente com Cristo – pela graça dois salvos. (Ef 2.2,3,5) Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte, mas se pelo Espírito mortificardes os feitos do corpo, certamente vivereis. (Rm 8.13)
     A cruz colocada sobre o coração. Com isso atingimos o fundo do paradoxo. O que significa isso? A cruz mortifica e dá vida. Mortificar significa levar à morte, matar. Em que sentido a cruz mata; e em que sentido a cruz dá vida? Este poder está na cruz de Cristo. Ela prega a lei, para mostrar a ira de Deus sobre o pecado. Deus não poupou seu próprio Filho. (Rm 8.32) Jesus carregou culpa alheia, a culpa da humanidade ao suportar a ira divina, estava pagando pelos pecados da humanidade, conquistando a vida.
     Cristo foi pregado na cruz por causa de nossas transgressões. (Is 53) Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando (atribuindo) aos homens as suas transgressões. (2 Co 5.19) Assim a cruz de Cristo se tornou a linha divisório entre a vida e a morte. Ao falar de sua ressurreição, Jesus disse: Eu vivo e vos também vivereis (Jo 14.19), e continuou: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá. (Jo 11.25)
     A morte de Jesus resgatou toda a humanidade da maldição da lei. (Salvação universal) (Gl 3.13; Dt 21.23) A cruz traz perdão, vida e libertação. Esta libertação é o início da verdadeira liberdade. O apóstolo afirma: Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida. (Rm 6.4) Esta novidade de vida acontece quando o coração é dirigido pelo Espírito de Deus. Andai no Espírito e jamais satisfareis a concupiscência da carne... E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, e com as suas paixões e concupiscências. Se vivemos n espírito, andemos também no Espírito. (Gl 5.16,24,25)
     Assim, a cruz no coração simboliza morte e vida. O justo viverá por fé. (Rm 1.17)

2. A rosa branca. Tal coração está colocado sobre uma rosa branca para indicar que a fé dá a paz que o mundo não pode dar. (Jo 14.27) A cor branca é a cor do Espírito Santo e de todos os anjos. (Mt 28.3; Jo 20.12)
     A rosa é o mais antigo símbolo para Cristo. (Alguns usam hoje o lírio branco como símbolo da ressurreição). Ela é branca porque traz a luz da ressurreição que brilha através da sepultura aberta. O branco é completamente oposto ao preto da cruz.
     O coração é colocado no centro da rosa branca, e não muda de cor. O coração não desaparece pala ação da vida. Antes a vida é viabilizada e cercada pela cruz da ressurreição, que simultaneamente mantém a memória da sombra da cruz. Por isso a rosa não é vermelha, mas branca para simbolizar a nova vida em Cristo, através da cruz preta.
    A nova vida em Cristo é vivida aqui na terra, no dia a dia, ainda com suas falhas e fraquezas no serviço ao próximo. O cristão é, simultânea e inteiramente, pecador e santo. Esta vida é vivida pela fé na graça de Cristo e enquanto a pessoa estiver na fé, sua vida é um constante louvor a Deus.

3. O azul celeste. A rosa é colocada num campo de azul celeste, a cor do céu. A alegria da fé, na verdade, já é o início da alegria celestial futura. Temos esta esperança, embora ainda não revelada. Tudo está envolvo na esperança da vida eterna. O apóstolo Paulo afirma: Em todas estas coisas, pois, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou. Porque eu estou bem certo de que nem morte, nem ida, nem anjos, nem principados, nem coisas do presente, nem do porvir... poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso senhor (Rm 8.37-39).
    O azul celeste simboliza o descanso. Todos os que crêem na graça de Cristo esperam novos céus e nova terra, nos quais habita justiça (2 Pe 3.13). Eles sabem que são filhos de Deus e herdeiros da vida, pois têm esta esperança em fé, e ao mesmo tempo aguardam a revelação final, quando passarão do crer para o ver.

4. O anel de ouro. Esta salvação é eterna. Ela perdura para toda a eternidade. Tal salvação é preciosa e está além de toda a alegria e bênção, como ouro refinado.
     O anel de ouro engloba tudo, também o azul celeste. Tal esperança não é uma utopia. A perfeição do círculo, que abraça tudo, assinala a conclusão definitiva. Não há mais nada a acrescentar. Como o anel dourado, a fé é completa. Justificação e salvação estão unidos um ao outro, a verdadeira possessão do bem supremo.
     A perfeição da fé é o reflexo da perfeição de Deus. Deus habita nos seus filhos pela graça de Cristo, pelo poder do Espírito Santo. A doutrina da Trindade está presente neste selo pelos significados da salvação.

Conclusão
     Em boa amizade eu digo isto a ti. Isto é o compêndio da minha teologia. – O compêndio da teologia de Lutero contém tudo de forma condensada e elementar. Ele anuncia o resumo elementar da teologia de Lutero. Ele destaca e aplica, do começo ao fim, a verdade: Deus por nós, pelo fundamento da graça de Cristo.
    O selo de Lutero é seu compêndio de teologia. É o selo do amor de Deus, que o próprio Cristo imprimiu no coração de Lutero. Não é de admirar que Lutero designou o selo como seu escudo. Embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno (Ef 6.16).
     Lutero sabia-se abraçado, armado e bem protegido em Cristo. Baseado neste seu conceito, o selo de Lutero está à disposição de todos os fiéis, e não é simplesmente a história privada de Lutero. Este selo tem servido ao luteranismo.
                                                           (Baseado num trabalho do Dr, Dietrich Korsch)



XV - História de Luteranos no Brasil
     A história de luteranos no Brasil começa cedo. Já em 1532, o filho de um amigo de Lutero, chamado Heliodoro Eobano desembarcou em São Vicente, SP, onde professou sua fé. No século XIX muitos europeus, que professavam a fé evangélica luterana vieram ao Brasil. Entre eles muitos eram luteranos convictos que conheciam as Confissões luteranas, outros mais liberais. Eles vieram de um Europa muito tumultuada, tanto no campo político como no campo religioso.
     Após a guerra dos 30 anos (1618 – 1648), também mais ao final as Guerras Napoleônicas (1806-1815), surgiu na Europa o desejo de união, tanto política como religiosa, especialmente entre luteranos e reformados. O primeiro passo decisivo foi dado pelo Imperador Frederico Wilhelm (Guilherme) II, o Grande ( 1712 - 1786). Muitos aderiram ao seu convite de união. Os luteranos comprometidos com o Livro de Concórdia não concordaram. O filho do Imperador, Frederico Wilhelm III (1793 – 1840), vendo que não conseguia a união pela boa vontade, usou a força. Ele decretou, por ocasião da celebração do terceiro milênio da Reforma Luterana (1817), a união, conhecida como União Prussiana. Seus efeitos se fazem sentir até hoje na Alemanha, pelos Luteranos Confessionais, da Selbständigen Evangelisch-Lutherischen Kirche (SELK).
      Por ocasião do terceiro milênio da Reforma Luterana (1817) a Alemanha era governada pelo imperador Prussiano Guilherme III. (Ele decretou a “União Prussiana”[2], isto é, a união entre luteranos e reformados, e estabeleceu a Igreja Cristã Evangélica. Vendo que seu decreto não fora seguido pelos luteranos confessionais, deu ordem para que se usasse a força. Pastores foram depostos de seus cargos e presos. Comunidades foram desapropriados de seus bens. Membros de diretorias foram presos ou tiveram que pagar multas elevadas. Foi um período muito difícil para os luteranos confessionais. Em meio a tudo isso começou a grassar na Europa o iluminismo e o racionalismo, especialmente também nas Universidades de teologia. A razão humana foi endeusada. Ela julgava tudo e foi colocada acima da Bíblia, o que favoreceu a expansão do humanismo. O jovem pastor C.F.W. Walther (1811 – 1887) bem como outros pastores fiéis, foram proibidos de batizar em nome do Deus triúno, devendo batizar em nome da liberdade, igualdade e fraternidade. Todos esses problemas, levaram muitos luteranos fiéis à Bíblia e as Confissões luteranas a emigrarem para outros países.
    A seu tempo, Deus providenciou alívio. O imperador Frederico Wilhelm III faleceu, bem assim o seu ministro da justiça, Altenstein muito cruel na execução das leis do imperador (1840). Seu filho, o imperador Guilherme IV (1842 – 1888), assumiu o governo. Ele mandou libertar pastores e leigos presos e anulou as multas.  Naquela época, a Alemanha ainda não estava consolidada em um pais, como a Espanha e a França. Os príncipes mandavam em seus territórios e determinavam a religião que deveria ser seguida. Quem não concordava, que se mudasse. Por vezes, um irmão ou primo da dinastia, assumia o território evangélico luterano e, sendo católico, determinava que daqui para frente todos serão católicos, (ou vice versa). Os pastores evangélicos eram substituídos por padres. Quem não concordasse que mudasse de território. O resultado foi que as pessoas se calaram e não falavam de religião, simplesmente acompanhavam, pouco importava se ali estava um pastor evangélico ou um padre.
     Naquela época muitos luteranos vieram para o Brasil, não tento em busca de iberdade religiosa, como os que mudaram para os Estados Unidos da América e para a Ausgtria, mas, entusiasmados pelo embaixador do Brasil que, amando da Princesa Isabel, convidou pessoas para vieram ao Brasil, com promessas de terras gratuitas e amparo. Promessas que na maioria dos casos não foram plenamente cumpridas.
     Em Goslar, Alemanha, surgiu um livro editado por um médico-filósofo de Blumenau, SC, no qual o médico afirma que no Vale do Itajaí, SC, residiam 15.000 evangélicos, procedentes de províncias luteranas confessionais. Em 1810, muitos luteranos russos da Bielorússia, de Volinien que estavam espiritualmente abandonados, vieram ao Brasil (C.F.: Hans Roser, p. 42).
    O pastor Brutschin, que trabalhou em Dois Irmãos, RS, relata sobre uma viagem missionária: Andei dois dias de trem, depois a cavalo, após alguns dias cheguei à Barro do Triunfo, RS. Fiz batizados, celebrei casamentos e fiz confirmações. Encontrei espanhóis, franceses, italianos, poloneses, suecos, russos, pommeranos e brasileiros. Enfim, de tudo o que se encontra debaixo do céu (Idem, p. 45).
     Na Alemanha, mesmo tendo muitos aceitado a União Prussiana, havia pastores isolados em um e outro lugar pregando, fielmente, arrependimento e fé. Surgiu nesse tempo também certo fervor missionário. Fundou-se a Gustaf-Adolf-Verein, em Neuendetelsau, o Gotteskasten, bem como outras instituições menores que impulsionavam a missão interna e externa. A maioria deles, no entanto, sem zelo pela pureza de doutrina, mas num espírito de união. Vejamos alguns exemplos. 
     Na Alemanha, impulsionados pelo pastor Johannes Konrad Wilhelm Loehe (1808 - 1872) de Neuendettelsau, foi fundada em 29 de janeiro de 1801 a Sociedade para amparo à missão interna e externa: Gotteskasten, na Baviera. Na reunião dia 17 de setembro de 1896, decidiram amparar os evangélicos-luteranos na diáspora no Brasil, pois lá, conforme o relatório deles, havia 60 mil imigrantes sem pastores. Só havia um e ouro pastor disperso em alguns lugares. Por exemplo, o pastor Heinrich Schwan (1844-1850) em Salvador, F. Brutschin no RS e outros. Algumas comunidades escolheram leigos dispostos que sabiam ler e escrever para serem seus pastores, sem formação teológica. Eles emprestavam algumas Agendas, livros de sermões e hinários (que muitos haviam trazido) e supriram a lacuna na falta de pastores, fundando comunidades evangélicas luteranas chamadas de Freigemeinden (comunidades livres), que não estão filiadas a nenhum Sínodo. Ainda hoje existem algumas no sul do Rio Grande do Sul.
     O pastor Hermann Borchard que veio em 1864 a São Leopoldo, fundou em 1868 o Sínodo Evangélico Alemão da Província de São Pedro, RS. Mas ele voltou em 1870 a Alemanha  e o Sínodo se dissolveu. Em 1870 chegou ao Rio Grande do Sul o pastor Dr. Wilhelm Rotermund. Pastor com muitos dons, enérgico e trabalhador. Atendeu a Comunidade em São Leopoldo e Lomba Grande, para onde ia a cavalo. Fundou uma gráfica, um Jornal e o Colégio Sinodal. Isto numa época em que a religião oficial no Brasil era a Católica. Aos evangélicos não era permitido construírem igrejas com torres e sinos. Os jesuítas dominavam. Mesmo assim, um pastor evangélico tentou construir uma igreja, mas ela foi derrubada. No início de dezembro de 1880, o culto dominical dos luteranos no Rio de Janeiro foi interrompido a pedradas (Rotermund, p.114). A liberdade religiosa só veio com a implantação da República em 1900.
     No dia 20 de maio de 1886 foi aceita a ata que constituiu o Sínodo. Rottermund, de origem luterana,. Ele queria queria que no nome do Sínodo constasse o nome Luterano, nas não conseguiu apoio dos demais. O nome aceito foi: Sínodo Evangélico da Confissão de Augsburgo. Os luteranos de Santa Catarina, Paraná e São Paulo não vieram, alegando a distância. Além desse Sínodo, conhecido depois como Sínodo Riograndense, já havia outros grupos em formação nos outros Estados.
     Em 1905 o Gotteskasten formou o Evangelisch-Lutherische Synodo. O pastor Otto Kuhr foi seu primeiro presidente. Nesta convenção de fundação foi apresentado um estudo sobre a Doutrina da Justificação, com a qual todos os 8 pastores e leigos concordaram.
     Antes, em dois de maio, pastores do Gotteskastem haviam fundado o Pfarrergemeinschaft: Envangelische Pastoreskonferens de Santa Catarina, apoiado pelo Gustav-Adolf-Werkes.
     Em 1961 o quadro era o seguinte: (Dados: Hans Roser, p.75)
- Riograndenser Synode (1886)
            - 679 Comunidades
            - 119 Pontos de Pregações
            - 335.000 Membros
            - 129 Pastores
- Lutherische Synode (Otto Kuhn) (1905)
            - 220 Comunidades
            - 67 Pontos de Pregações
            - 116.000 Membros
            - 34 Pastores
- Evangelische Synode de Santa Catarina e Paraná (1911)
            - 116 Comunidades
            - 27 Pontos de Pregações
            - 103 Membros
            - 26 Pastores
Mittelbrasilianische Synode (Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo. (1912)
            - 19 Comunidades
            - 67 Pontos de Pregações
            - 38.000 Membros
            - 18 Pastores.

    No dia 25 de outubro de 1968 todos esses Synodos aceitaram os Estatutos do Sínodo de Confissão Luterano no Brasil: Igreja Evangélica da Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Sem uma posição doutrinária definida, eles buscam uma teologia correspondente aos desafios do pais. O pastor Hermann Borchard e o seu sucessor pastor Schwartz não se filiaram aos Sínodo. O pastor Brutschin que participou do primeiro Sínodo, fundado pelo pastor Borchhard, bem como do Sínodo, fundado pelo pastor Rottermund, desejava um Sínodo confessional. Vendo que isso não aconteceu, não se filou a esse novo Sínodo.

Missouri
    Em 1900 veio ao Brasil, enviado pela Lutheran Church Missouri
Synod (LCMS), o pastor Broders. Em 1907 fundou-se a Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). Em 1965, a IELB contavam com 131 paróquias, ou seja: 997 Comunidades, 147 pastores, 130.672 membros.
    Esse é o quadro de luteranos no Brasil.
     Em tudo isso fica uma pergunta: Por que nosso Sínodo não participou, em 1968 do Synodo da IECLB?
     Temos só uma explicação. Os pastores da IECLB eram apoiados pelo Gotteskasten-Verein de Loehe. O pastor Loehe foi um pastor fiel às Confissões luteranas. Estava bem relacionado com a LCMS e apoio os pastores ali. Ele estava filiado à Bayerische Landerkirche, muito liberal. Na Convenção dessa igreja em 1849, ele mandou moções para sua igreja, pedindo fidelidade ás Confissões e repreensão aos pecados grosseiros. Nisso ele foi apoiado por 24 colegas pastores e muitos leigos. Mas, em vão. O Sínodo não tomou nenhuma providência nesse sentido. Loehe se aconselhou com o prof. Delitzsch sobre ficar no Sínodo ou sair dele. Delitzsch, liberal, o aconselhou a ficar no Sínodo. Esta sua indecisão frustrou outros pastores. Em 1852 o pastor dos USA, C.F.W. Walther e Wynecken, este último aluno de Loehe, foram visita-lo. Loehe infelizmente não concordou com Walther em vários pontos doutrinários, como: Igreja e Ministério e outras doutrinas. Com isso se afastou de Missouri. Ao mesmo tempo, ele foi caindo cada vez mais. Por fim defendeu a doutrina do milênio, a volta de Cristo para governar mil anos aqui na terra. Tudo isso gerou na Igreja de Missouri certa reserva contra os pastores da Alemanha vindos e apoiados pelo Gotteskasten, mesmo que muitos deles eram luteranos fiéis. Além disse, somou-se o fato de os pastores que vieram com os colonos para o Brasil, mesmo que apoiados, parcialmente pelo Gotteskasten ada Alemanha, tiveram que lutar por seu sustento. Não encontrando apoio nos membros que inicialmente começaram no mato, mas agora tinham suas casas e construíram seus Clubes (Schützenverein, Gesangverein), não apoiavam os pastores. Por essa razão, para poderem ganhar um pouco de tempo para instruir os membros e a juventude, os pastores resolveram cobrar taxas. Essas taxas foram um escândalo aos olhos dos pastores enviados por Missouri e amparados por eles. São estes alguns fatos que nos mantiveram afastados da IECLB. Além disso a indefinição doutrinária da IECLB, que seguia o espírito da União Prussiana. Compreenderemos isso ainda melhor, ao lermos o relato do Prof. Otto A. Goerl, sobre nossos contatos com a IECLB.  


XVI - Aproximação entre IELB e IECLB
     Este relatório foi feito pelo Prof. Dr. Otto A. Goerl. Ele é, ainda hoje, muito útil para  compreendermos os esforços que foram dispensados no passado pela IELB em relação à IECLB.
1.      Dado históricos da IECLB – 75 Anos de existência do Sínodo Riograndense.
- 1824 – Chegada dos primeiros 43 imigrantes a São Leopoldo (35 evangélicos)
- 1868 - O Pastor Dr. Borchard (São Leopoldo) funda o primeiro Sínodo com 9 pastores
               e alguns leigos. Dissolveu-se em 1872.
- 1886 – Pastor Dr. W. Rottermund (S. Leopoldo) funda o Sínodo Riograndense com 12
               pastores, dois professores e 9 leigos.
- 1888 – Surge a Folha Dominical, que em 1912 passa para o Sínodo.
- 1900 – Filiação do Sínodo ao Evangelicher Oberkirchenrat da Alemanha.
- 1901 – Modificou o nome de O Sínodo Riograndense para:
                    Deutsche Evangelische Kirche von Rio Grande do Sul.
- 1928 – Filia-se ao Deutscher Evangelischer Kirchenbund.
- 1945 – Escola de Teologia em São Leopoldo.
- 1950 - Forma-se a Federação Sinodal com o nome de Igreja Evangélica de Confissão              
             Luterana no Brasil. (IECLB), composta por:
1.      Sínodo Riograndense
2.      Igreja Luterana do Brasil
3.      Sínodo Evangélico de Santa Catarina e Paraná (Gotteskasten[3])
4.      Sínodo Evangélico do Brasil Central.

2.      Congressos Latino-americanos
     Associada à Federação Luterana Mundial (FLM) (além do Conselho Mundial de Igreja CMI), a IECLB lidera o movimento que visa congregar sob a mesma bandeira todos os que no nosso continente se consideram luteranos. Segue a relação dos congressos:
1º 1951 – Curitiba, PR
2º 1954 – Petrópolis, RJ
3º 1959 - Buenos Aires, Argentina. (Da EILB participaram: Prof. Dr. Paulo Schelp,   
                   Presidente Arnaldo Schneider, prof. Otto A. Goerl)
4º 1965 – Lima, Peru.  (Prof. Dr. Hans Rottmann, Prof. Arnaldo Schmidt, prof.
                   Dr. Mário  Rehfeldt )
5º 1972 – José C. Paz – Argentina. (Dr. Carlos M. Warth, Prof. Elmer Reimnitz)
6º 1980 – Bogotá, Colômbia. (Dr. Johannes Gedrat, Dr. Carlos M. Warth, Pastor
                  Leopoldo Heimann)
7º 1986 – Caracas, Venezuela. (Dr. Johannes Gedrat)

3.      Que significa a bandeira da Confissão Luterana
     Um bom confirmando nosso saberia responder: Fidelidade à palavra de Deus.                                                                                            Joseph Lortz, historiador católico, acrescentaria: “Esse contato extremamente pessoal com os dizeres (Wortlaut) da Bílbia dominou toda a existência do Lutero, foi o acontecimento mais importante da Reforma”. O Sola Scriptura é a coluna mestra da fiel Igreja Luterana, seguida pelo Sola Gratia e o Sola Fide. Na bandeira de Lutero chamejavam as letras: A Escritura não pode falhar. (Jo 10.35) Jesus identifica a Palavra de Deus como a Verdade: Eu lhes tenho dado a tua palavra... Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade (Jo 17.14,17). Já antes havia dito: Se vós permanecerdes na minha palavra, sois verdadeiramente meus discípulos e conhecereis a verdade e a verdade vis libertará (Jo 8.31,32). Jamais Lutero estendeu a mão fraternal aos que não se curvavam diante da Escritura. Só este Lutero é autêntico e verídico. Outro não existe.

4.    Sendo tarefa da Igreja “discernir o tempo”, vejamos em que sentido e até
onde IECLB (e a FLM) tem raízes confessionais idênticas as nossas.
a)      A luta confessional. Esta luta começou no 1º Sínodo em 1868, liderado pelo
Pastor Dr. H Borchard, o qual havia proposto a filiação à Igreja Prussiana Unida. Os pastores J. P. Haesbert, genuíno luterano e R. Kroene, que batalhavam em favor da confissão luterana, discordaram. Após quatro anos, este Sínodo se dissolveu.
     Numa segunda tentativa, 1886, sob a liderança do Pastor Dr. W. Rotermund, não houve objeções, pois o parágrafo confessional estabelecia: “Die Synode bekennt sich auf Grund der Heiligen Schrift zu den Symbolen der deutschen Reformation und schliesst sich in Kultus, Lehre und Disciplin an die Kirche der Reformation an.” (O Sínodo confessa à base da Escritura Sagrada e os Símbolos da reforma alemã e se une em culto, ensino e disciplina à Igreja da Reforma.)
Perguntamos: A Escritura é a palavra de Deus? O Antigo Testamento está incluído? Os símbolos da reforma alemã são as Confissões luteranas reunidas no livro de Concórdia? A igreja da Reforma é a genuína Igreja Luterana ou inclui também as igrejas   reformadas e unidas?
b)      Em 1923 o parágrafo foi reformado e traz uma melhora: “Die Synode
bekennt sich auf Grund der Heiligen Schrift zu den Symbolen der Reformation Martin Luthers, vor allem der Augsburgischen Konfession und Luthers Kleinen Katechismus. Sie schliesst sich in Gottesdinstordnung, Lehre und Kirchenzucht an die Evangelische Kirche Deutschlands (EKD) an.”
Perguntamos: Por que uma formulação tão vaga?  A Augustana é a variata ou a autêntica? Por que não adotam todas as confissões luteranas, entre elas a Fórmula de Concórdia? Por que nosso livreto “Cremos, por isso também falamos” não teve aceitação na IECLB? A Igreja Evangélica da Alemanha (EKD) reúne luteranos e reformados, logo, ela deixa de ser luterana. Lutero não fazia tais compromissos.
c)      Para clarificar nosso posicionamento, algumas citações:
-  A Federação Sinodal – fiel à sua própria história – procura manter-se no mais estreito contato com a pesquisa teológica da Igreja mãe, como também com a teologia evangélica em geral.
- Tatsaechlich hat die Synode bis heute weder reformierte Pfarrer abgelehnt noch refomierte Christen an eine andere Kirche geweiesen... Sie hat alo Zugehoerigkeit zum reformierten bekenntnis nicht als kirchentrennend angesehen. (Tr.: De fato o Sínodo, até hoje, não afastou do seu meio nem pastores reformados, nem recomendou a membros reformados que se filiassem a outras igrejas... Ela, portanto, não considerou o pertencer à confissão reformada como motivo de divisão de igrejas).   
- Lutherisch oder reformiert? Wir, die wir der deutschen-evangelischen Kirche von Rio Grande do Sul angehoeren, wollen diese Frage gerne vermeiden. (Tr.: Luterano ou reformado? Nós, que pertencemos ao Sínodo alemão Riograndesse, gostamos de evitar esta pergunta.)
- Sobre o Antigo Testamento: Das Alte Testament ist ein jüdisches und kein christliches Buch. …Was uns nicht zusagt, oder was wir nicht gebrauchen koennen, das werden wir auf Grund unserer christlichen Erkenntnis schon herausfinden. (Tr.: O Antigo Testamento é um livro judaico e não cristã... O que não nos condiz, ou o que não nos dá proveito, isto saberemos avaliar à base de nossos conhecimentos cristãos.)
 - Sobre a pessoa de Cristo: Was wir von seiner Person halten, ob Menschenkind oder Gottessohn, ob sein ueberliefertes Bild strenge geschichtliche Wirklichkeit, ob eine von der Dichtung anbetender Liebe verglaeserte Gestalt- das soll uns nicht sorgen. (Tr.: O que pensamos a respeito da pessoa de Cristo se é filho humano ou filho de Deus, se as descrições de sua pessoa história são uma transmissão fiel ou uma invenção enfeitada pelo reverente amor, isto não nos preocupa.)

5.      Para onde marcha o “luteranismo da IECLB e a FLM e os Congressos Latino-americanos?
     Documentos de estudo da FLM. “Diante desses documentos deve-se evitar uma posição que seja somente retrospectiva e doutrinária, a qual se concentra primariamente na superação das diferenças doutrinárias oriundas do passado e tira ao diálogo a sua direta função de orientador, quanto à tarefa da pregação da igreja... Trata-se de em comum explicar e formular de maneira nova o evangelho em relação a atual situação do testemunho... Neste aspecto deveria residir o peso de todos os diálogos doutrinários entre as igrejas”. (5º Congresso Latino Americano, p. 89)
     O apóstolo Paulo discorda desse logro humano. Ele escreve: Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema.  Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema (Gálatas 1.6-9). É como se o apóstolo suspeitasse ser a concessão uma das causas da apostasia, por isso adverte: Porventura, procuro eu, agora, o favor dos homens ou o de Deus? Ou procuro agradar a homens? Se agradasse ainda a homens, não seria servo de Cristo (Gálatas 1.10; Cf.: 2 Co 11.3,4).
     Citações do livreto:Os novos Movimentos Transculturais e as Igrejas” elaborado pelo Instituto Ecumênico de Pesquisas de Estrasburgo, ligado à FLM, editado pela Editora Sinodal – é praticamente a cartilha dominante nos Congressos Latino Americano.
“Movimentos de renovação esperam uma radical mudança de orientação por parte das igrejas em direção ao que é realçado por eles como central para a vida e a fé cristã”.
“Para os evangélicos (seríamos nós, do antigo evangelho, luteranos ortodoxos) o ponto principal da fé e o centro da ação de Deus no mundo são... a conversão e salvação do indivíduo... Missão significa a conversão de não-cristãos para a fé em Jesus... A doutrina da inspiração verbal da Escritura... colocou-os (nós, evangélicos) em conflito com novos desenvolvimentos na teologia, com a pesquisa histórico-crítico, por exemplo”. 
“Os evangélicos são... encarados como adversários do processo da secularização e liberalização, digo, liberalização da Igreja e sociedade”.
“Os evangélicos fazem nítida distinção entre crentes e não-crentes e consideram o mundo em princípio irredimível. Em conformidade com isso, o engajamento cristão em questões políticas, o diálogo com pessoas de outras religiões e cosmovisões, bem como o esforço pela unidade da humanidade, assim como são expressos ou propostos em alguns programas do CMI são, de modo especial, objeto da crítica evangélica. O CMI já há tempo realiza cultos ecumênicos com budistas e congêneres”. 
“O movimento centrado na ação surge de uma aguçada consciência ética frente ao sofrimento, opressão e exploração humana. O imperativo cristão ou a forma autêntica de expressão da fé e de testemunhos cristãos consistem em mudar o mundo político e social que, para muitos, representa a realidade essencial ou única”. Daí os slogans: “Libertação e renovação do mundo”. “Ação libertadora de Deus na história atual”. “Atividade e ética do Jesus terreno”. A teologia da libertação. Missão Integral”.
“Pluralidade dialógica é o que propõe o Documento da FLM no final do Estudo. Prevê ele ser possível a unidade “lá onde não apenas se dá lugar a uma legítima multiplicidade de convicções ecológicas e formas de vida eclesial no contexto e nos limites de uma tradução eclesiástica, mas também se fundamenta e confirme essa multiplicidade teológica e bíblica... Tratar-se-ia aí, por último, de introduzir com todo o empenho ecumênico como desafio e impulsos, a experiência, feita nos movimentos, de uma unidade que ultrapassa as fronteiras das confissões
”. “Assim termina o Documento.
    Vemos que a pluralidade dialógica praticada nos Congressos Latino-Americanos visa a unidade de convicções teológicas que ultrapassam as fronteiras das confissões. Só resta a bandeira, essa a meio pau. Enquanto isso, adornam-se os túmulos dos justos (Mt 23.29)     

6.      Nós e a IECLB
     Procuramos um encontro com o Presidente da IECLB, décadas atrás. Ele se negou. Na década de 60 fomos convidados para um retiro de um dia, nas proximidades de Porto Alegre. Estávamos presentes, seis de cada lado, três professores e três pastores. De manhã, um deles fez uma preleção sobre Marcos. De tarde li um trabalho sobre “Unsere Botschaft an die Welt von heute.[4]” Num espírito fraternal disse tudo o que deveria dizer. Mal começou a discussão, não saímos da primeira página. O que nos separa é o posicionamento frente à Bíblia. Isso ficou comprovado pelo relatório oficial do Congresso da América-Latina em Lima (o quarto). Repetidas vezes constatou-se a divergência entre os nossos três preletores (Lange da Argentina, Rottmann e Mário Rehfeldt do Brasil) e os outros com respeito ao entendimento diferente da Escritura como Palavra de Deus. Pois para eles, a Bíblia não é a palavra de Deus, mas apenas a contém. Quem decide é a razão humana. Assim negam a doutrina da inspiração. E não recuam um passo sequer. Por isso muito cuidado com a participação nos aludidos congressos.
     Por outro, não negamos nossa colaboração “in externis”, isto é, em tarefas nas quais não está em jogo nossa posição confessional e a finalidade expressa da igreja de “pregar arrependimento para remissão de pecados a todas as nações (Lc 24.47), como na tradução da Bíblia, representações oficiais em assuntos escolares, etc.
     Que Deus nos conceda firmeza nas confissões e seu santo nome para a glória de Deus. Misericórdia, graça e lealdade para conosco. Sejamos nós leais!
                                                                                                              Otto A. Goerl[5]

Novo Conato
     Nos anos 1975, se não me falha a memória, surgiram, nos campos de missão e com isso alguns problemas entre nossos pastores (IELB) e os pastores da IECLB. Os problemas se caracterizaram por intromissão nos trabalhos. A Diretoria Nacional da IELB convidou a Diretoria da IECLB para um diálogo. Não me recordo de quantos encontros tivemos. As reuniões foram cordiais.
     Sabendo que na década de 60 se realizaram algumas reuniões entre as faculdades de Teologia da IELB com a da IECLB, e que nossos professores haviam abandona a última reunião, alegando ser impossível dialogar sobre doutrina, visto não termos a mesma base. Para nós IELB, a Bíblia é a palavra inspirada por Deus, única autoridade para a fé e a vida, enquanto que para a IECLB, a Bíblia contém a palavra de Deus, sendo a razão humana a última juíza sobre o que é e deve ser aceito como palavra de Deus e como deve ser interpretado. Nós aceitamos a Bíblia porque (quia) ela é a Palavra de Deus, a IECLB aceita a Bíblia enquanto (quatenus) a considera a Palavra de Deus.
     Diante disto perguntei ao prof. O. A. Goerl se devemos retomar o diálogo? Ele respondeu: Cada geração tem sua responsabilidade. Mudaram as pessoas, portanto, tentem novamente. Mas, cuidado. Não se deixem enrolar por palavras vãs.
     Para um diálogo com outas religiões cristãs, duas coisas são necessárias: Primeiro, que SE conheçamos bem nossA própria confissão, nosso posicionamento, saibamos expressá-los corretamente e de como são praticados. Por outro, que conheçamos bem os ensinamentos da religião com a qual queremos dialogar e de como ela a pratica.
     Nós respeitamos as outrs confissões. Sabemos que nelas há cristãos. Nosso diálogo com eles será de respeito. Procuraremos, com toda a cordialidade e amor, mostrar nossa posição, a saber, a posição da Bíblia, da qual não abriremos mão.
     Não podemos esquecer que vivemos na época das comunicações. Qualquer afirmação nossa corre facilmente pelo mundo. Além disso estamos na era do ecumenismo, do não discriminar ninguém. Época na qual todos são considerados irmãos. Não se admite grupos fechados, nem verdade absoluta. Cada um pode ter sua verdade para si mesmo. Dentro desse quadro é difícil levar alguém a compreender nossa posição, ensinando verdade absoluta e apego fiel à Escritura.




[1] Ainda hoje temos vários pastores nossos trabalhando com a Soc. Bíblica do Brasil: Dr. Rudi Zimmer, Dr. Erni Seibert,  Dr. Vilson Scholz, Dr. Rev. Paulo R. Teixeira e outro.
[2] Cf.: Terceiro Milênio da Reforma Luterana.
[3] O sínodo Gotteskasten. O nome “Caixa de Deus! provém de nosso meio luterano da Alemanha, de Loehe (21/02/1872-02/01/1872). Loehe foi um pastor luterano fiel. Enviou missionários aos Estados Unidos da América e a outros países. Ele coletou dinheiro para amparar missionários no exterior, daí a palavra “Caixa de Deus”.  Eles foram um grupo fiel às Confissões. Os pastores vieram com os agricultores e tiveram que lutar com eles por sua subsistência, desmatando matos, plantando, visto que os auxílios da Alemanha eram parcos. Quando os agricultores se firmaram, construíram seus “Vereine” (Clubes: Sociedades de canto, etc.). Os pastores pediram ofertas para poderem se dedicar ao trabalho. As ofertas não vieram, então passaram a cobrar taxas para batismos, casamentos, sepultamentos. Nossos missionários dos Estados Unidos receberam seus salários da igreja que os enviou.  Estes nossos missionários se chocaram com a cobrança de taxas e escreveram folhetos contra isso, sem conhecerem as verdadeiras razões das mesmas; nem a posição doutrinária desses pastores, tendo já certa aversão a Loehe. Isto os forçou a se unirem com à IECLB. Mas até hoje há entre eles pastores muito fiéis.
[4] Trabalho do Prof. Otto A. Goerl, publicado em língua alemã na revista teológica greja Luterana, Ano XXVI, Porto Alegre, 1965, Nº 3 e 4, pág. 222 – 235.  A tradução do trabalho anexo aqui.
[5]   Relatório preparado para a comissão de moções que estuda a proposta de se filiar ou não à Federação Luterana Mundial, na 37ª Convenção, reunida no Seminário Concórdia nos dias 21 a 28 de janeiro de 1962.

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