A Bênção
Vamos ocupar-nos um pouco com “A Bênção araônica”. O que é uma bênção?
Bênção é um bem que recebemos de alguém. Existem bênçãos pequenas e maiores,
muito ou menos valiosas. Bênçãos que recebemos de alguém, de pais e amigos. A fonte
de todas as bênçãos, mesmo recebidas de alguém, quer sejam materiais ou
espirituais, provém, unicamente, de Deus.
Deus é a fonte de todo o bem, de todas as
bênçãos. “Toda boa dádiva e todo dom
perfeito é lá do algo, descendo do Pai das luzes, em que não pode existir
variação, ou sombra de mudança. Pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela
palavra da verdade, para que fôssemos como que primícias das suas criaturas”
(Tiago 1.17, 18). O apóstolo Paulo escreve: Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem
abençoado com toda sorte de bênçãos espirituais... (Efésios 1.3). Por isso
cantamos: “Do poder de Deus depende / tudo o que o homem empreende, / e não de
outro bem qualquer... “ (HL 478.1).
A bênção pode ser material ou espiritual.
Na bênção material lembramos que Deus nos criou, mantém, protege, guia e ampara.
Ele concede dons e bens. Como o confessamos no 1º Artigo do Credo Apostólico.
As bênçãos espirituais são nos transmitidas pelos meios da graça, Palavra e
sacramentos; as quais recebemos em fé.
Devido a nossa pecaminosidade, não
merecemos as bênçãos de Deus. Mesmo
assim, Deus no-las concede graciosamente por sua bondade. A nós cabe recebe-las
com gratidão e ações de graça. O salmista diz: “Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e não te esqueças de nem um só de
seus benefícios. Ele é quem perdoa todas as tuas iniquidades; quem sara todas
as tuas enfermidades; quem da cova redime a tua vida” (Salmo 103.2-4).
Nós temos duas formas específica de
bênçãos registradas na Bíblia, uma no Antigo Testamento e outra no Novo
Testamento:
- Disse
o Senhor a Moisés: Fala a Arão e a seus filhos, dizendo: Assim abençoareis os
filhos de Israel; dir-lhes-eis:
O Senhor te abençoe e te
guarde;
o Senhor faça resplandecer o
seu rosto sobre ti,
e tenha misericórdia de ti;
o Senhor sobre ti levante o seu
rosto, e te dê a paz.
Assim porão o meu nome sobre os
filhos de Israel, e eu os abençoarei (Números 6.22-27).
A bênçãos específica do Novo Testamente temos do apóstolo Paulo:
- A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do
Espírito Santo sejam com todos vôs (2 Coríntios 13.13). – As outras fórmulas que o apóstolo
usa são abreviações desta.
Vamos nos deter um pouco com a bênção Araônica.
A bênção Araônica
Esta bênção Deus ordenou aos sacerdotes do
Antigo Testamento. Eles deveriam encerar o culto de sacrifício com esta bênção,
para despedir o povo. No tempo de Lutero, esta bênção foi novamente introduzida
no final do culto evangélico. A Comunidade é dispensada com a bênção.
Histórico
Quando o povo de Israel foi libertado da
escravidão egípcia, Deus, por meio de Moisés, convocou o povo de Israel, ao pé
do monte Sinais. Ali Deus lhes entregou a lei. Nesta lei, Deus estabeleceu
também a ordem do culto para os judeus. O culto com os sacrifícios, os quais
apontavam para Jesus, o Cordeiro de Deus
que tira os pecados do mundo (Isaías 53; João 1.36). Deus escolheu o irmão
de Moisés, Arão e seus filhos para serem sacerdotes. A eles (um deles, ao que
dirigia o culto) cabia transmitir ao povo, a bênção de Deus. Disse o Senhor a Moisés: Fala a Arão e a
seus filhos, dizendo: Assim abençoareis os filhos de Israel; dir-lhes-eis: O
Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti,
e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o seu rosto, e te dê a
paz. Assim porão o meu nome sobre os filhos de Israel, e eu os abençoarei
(Números 6.22-27).
Significado
Assim
porão o meu nome sobre o povo. Estar sob o nome de alguém, digamos, de uma
pessoa poderosa, de um rei, significa desfrutar dos bens, da proteção e também
reponsabilidade, para fazer jus ao nome da pessoa. Ninguém pode, por sua
vontade, pôr-se sob o nome de alguém, usar o nome de alguém e atuar em nome de
outro, sem autorização. Pôr o nome de Deus sobre o seu povo significava que Deus
se compromete, graciosamente, com seu povo, para guiá-lo, protege-lo, ouvir as
orações e conceder toda a sorte de bens ao seu povo. Por isso Deus conclui: E
eu os abençoarei, isto é, cumprirei o que prometi. Que maravilha.
Algumas
observações iniciais. Os sacerdotes devem terminar o culto com a bênção.
Pronunciar a bênção, pôr o nome de Deus sobre o povo. Com isso Deus não estava
abrindo mão de sua bênção. A bênção, propriamente dita, Deus dará. E ele a dará
como e quando lhe aprouver, na medida
que ele determinar. Deus sabe o que e que medida da bênção fará bem a uma
pessoa, a um mais a outro menos. O importante aqui é notar a forma direta, não
subjuntiva de um desejo; nem no plural, mas no singular: te abençoe. O sacerdote
não deveria dizer: Que Deus vos abençoe. Não. O Senhor te abençoe, forma
direta. Era uma bênção individual a cada um ali presente. Por ser ordem direta,
um ato de Deus, podemos dizer (mesmo faltando o elemento material), é um ato
sagrado, sacramental, pois não é simples desejo de alguém a nós.
Lembro-me de minha primeira Comunidade em
Passo do Santana (1960). Lá tínhamos dois sinos. Fora as duas chamadas para o
culto, batia-se três vezes o sino no culto: Para o início, na hora da oração do
Pai Nosso, e na bênção, no término do
culto. Isto para que aqueles que não puderam vir ao culto fossem lembrados: Começa
o culto. Na segunda batida, pudessem juntar a mãos e orar o Pai Nosso junto. No final, sabiam: Está
sendo dado a bênção, que os incluía. No meu início na Comunidade “Cristo” em
Porto Alegre (1983), ainda era assim. Depois, com a descristianização, e os
programas na televisão, a vizinhança começou a reclamar. Tivemos que restringir
o bater dos sinos. Estes detalhes, na bênção, não podem ser esquecidos.
O significado
Três vezes aparece a palavra “Senhor”, o
que indica a Trindade, Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Cada frase, tem dois
assuntos, por exemplo: te abençoe
e te guarde; faça resplandecer o seu rosto e tenha misericórdia; levante o seu
rosto e de dê a paz.
Vejamos esses detalhes. A primeira frase.
- O Senhor te abençoe e te guarde. Aqui
temos a primeira pessoa da Santíssima Trindade, Deus Pai, o Criador e
mantenedor de todas as coisas, que governa céu e terra, e é fonte de todas as
bênçãos. Deus abençoou os primeiros pais, Adão e Eva lhes disse: “Sede fecundos, multiplicai-vos, e enchei a terra
(Gn 1.28). Vemos no Antigo Testamento pessoas pedindo estas bênçãos: Chuva,
boas colheitas, proteção contra inimigos. Vemos como Deus manteve o povo de
Israel durante 40 anos no deserto. Proveu-lhes o maná, codornizes e água. Pela
nuvem que ao acompanhava, deu-lhes sombra, durante o dia e pela coluna de fogo,
que os acompanhava, luz durante a noite, assegurando-lhes sua assim a presença.
Suas roupas e sandálias não se desgastaram. Ao pedirmos bens materiais, os
pedimos dizendo: Seja feita a tua vontade.
Deus sabe o que nos fará bem ou mal. Quando somos abençoados queremos cuidar
para não usarmos as bênçãos egoisticamente só para nós ou dela nos orgulhar
como se fossemos nós que a providenciamos. Não! Toda a honra e glória cabe a
Deus.
O
Senhor te abençoe e te guarde. Toda a proteção provém de Deus. Não cai um
cabelo de nossa cabeça sem a sua permissão. “Se o Senhor não guardar a cidade,
em vão vigia a sentinela” (Salmo 127).
- O Senhor faça resplandecer o seu
rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti. Aqui temos Jesus Cristo, nosso Salvador, a segunda
pessoa da Santíssima Trindade. Ele cumpriu, integralmente, a lei de Deus em
favor da humanidade. Ele tomou os pecados de toda a humanidade sobre si e, por
seu sofrer e morreu na cruz do Gólgota, pagou por eles. Ele triunfou sobre
nosso inimigos, pecado, morte e Satanás. Por sua ressurreição, Deus Pai
confirmou que aceitou todo este trabalho e sacrifício de seu Filho Jesus em
favor de toda a humanidade e está reconciliado com ela. Jesus ordenou que se
anunciasse a todas as nações: Arrependei-vos e crede no Filho, para perdão de
vossos pecados. Através da Palavra de Deus, do evangelho, Jesus faz
resplandecer o seu rosto sobre nós. Ele se mostra gracioso, misericordiosos e benigno a nós.
Apesar de sermos pecadores e mesmo como cristãos termos ainda muitas fraquezas
e pecados, não precisamos temer. Jesus nos convida dizendo: Vinde a mim todos os que estais cansados e
sobre carregado e eu vos aliviarei (Mateus 11.28). E nós pedimos: Restitui-me a alegria da tua salvação, e
sustenta-me com um espírito voluntário (Salmo 51.12). Por isso temos aqui o
segundo item: e tenha misericórdia de ti. Bênçãos que Jesus nos anuncia pela
absolvição no culto, pela pregação e a lembrança de nosso batismo e pela Santa
Ceia. Lutero disse com razão: Jesus encheu todos os cantos de sua igreja e das
salas de cultos com o seu perdão. Ele sabe como é difícil crer e se consolar
com o perdão.
- O Senhor sobre ti levante o seu
rosto e te dê a paz.
Aqui temos a terceira pessoa da Santíssima Trindade, o Espírito Santo, o
Consolador e vivificador. O levantar do seu rosto é como o despertar do sol de
manhã, que ilumina, clareia e legra tudo, dá vida e ânimo. A função do Espírito
Santo é anunciar e dar-nos a paz. Visto que por própria razão ou força não posso
crer em Jesus Cristo, nem vir a ele. O Espírito Santo nos chama pelo evangelho,
ilumina com seus dons, santifica e conserva na única e verdadeira fé. Assim nos
concede paz de consciência, nos consola com o perdão, enche nossa alma da
esperança da vida eterna. Ele nos concede uma paz que o mundo não pode dar, uma
paz que excede a todo o entendimento (Filipenses 4.7).
Visto estarmos aqui ainda sob a cruz,
expostos a sofrimentos, visto estarmos aqui na igreja militante, a saber em
guerra contra nossa natureza pecaminosa, contra as tentações do mundo e a
ciladas de Satanás, ainda cheios de fraquezas na compreensão da palavra de Deus
e quedas diárias em pecados, o Espírito Santo nos consola em todos os
momentos. Vejam com que paz e alegria os
mártires, fortalecidos pelo Espírito Santo, enfrentaram a morte crucial. Como o
Estevão viu o céu aberto, ora pelos inimigos e parte em paz.
Em cada culto somos confortados pela
absolvição, firmados na paz pela palavra de Deus e fortalecidos na fé e na
esperança da vida eterna, pela participação na Santa Ceia.
Assim a bênção no final do culto é o
verdadeiro AMEM de Deus a seus filhos. Ele garante que tudo o que ouvimos e
aprendemos de sua palavra é verdade e amém. Que ele, assim como acompanhou o
povo de Israel no deserto de dia e de noite, estará ao nosso lado em todos os
dias e passos.
Questões práticas
Em primeiro lugar uma palavra aos
pastores. Como administrar a bênção? Em nos cultos regulares, o pastor dá a
bênção no final do culto. Ele volta-se para a Comunidade, levanta suas mãos e
profere a bênção, de forma clara e pausada, não como alguém que está apressado
por estar no fim do culto. Ele quer que todos, crianças, jovens adultos e
idosos ouçam bem a bênção, pois é um momento em que ele só empresta sua voz e
suas mãos a Deus. Quem age aqui, fala e levanta as mãos sobre nós, é Deus, que
atua nos corações.
Chamamos atenção, quando há cultos festivos
com pastores convidados, por ocasião da instalação de um pastor, aniversário da
congregação ou um congresso. Nestes momentos não faz sentido todos os pastores
ali presentes irem, na hora da bênção, para frente, levantarem as mãos e
proferirem a bênção, o que acontece, infelizmente, na maioria das vezes. Isto
dá motivo para piadas que tenho ouvido: - Hoje fomos bem abençoados, por
pastores de peso! Quem deles será que tem a bênção mais poderosa? etc. Isto
revela, tanto por parte dos pastores, como dos membros, que não compreendem a
bênção. Cabe ao pastor principal, normalmente ao liturgista, o pastor do local,
sozinho proferir a bênção. Cabe a ele só, colocar o nome de Deus sobre os
presentes, por mais bonito que seja o “folclore” de ver, neste momento, todos
os pastores ali, dando a bênção. Este momento pode ficar para a fotografia
depois da bênção.
Outro detalhe. A bênção é o ponto final do culto. Em muitas Comunidades
há o costume de terminar o culto com um hino, ou a última estrofe de um hino,
cantado por todos em pé. Temos até alguns hinos apropriados para isso, como por
exemplo o hino “Em paz e com perdão... “ (HL 197). Liturgicamente, no entanto,
não deveria seguir mais nada após a bênção.
Em algumas Comunidades os membros se
despedem após o culto, dizendo: Que Deus o abençoe, ou lhe conceda uma semana
abençoada. – Ora, Deus nos deu sua bênção. Portanto, tal saudação de despedida
não faz muito sentido. Algo melhor seria
talvez: Vai em paz! Ou o Ósculo da paz.
Importante é instruir e orientar bem a
Comunidade a esse respeito sentido.
A graça do Senhor Jesus Cristo, e
o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vôs. Amém
São Leopoldo, 15 de julho de 2016
Horst R. Kuchenbecker
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